Abril inspira oito espectáculos inéditos do Braga En’Cena
2020-10-17 às 10h00
Numa viagem pela região dos vinhos verdes, com incursão pela vindima, pelos sabores e aromas daquela que é a região demarcada mais antiga de Portugal, na companhia de Manuel Pinheiro, presidente da Comissão de Viticultura dos Vinhos Verdes, analisou-se o ano, falou-se de novos mercados, da ligação ao território e também do futuro.
P - Mercado nacional sofreu com todas as contigências. Mas nas exportações o Vinho Verde continua a surpreender?
R - Durante muitos anos achávamos que o Vinho Verde estava um bocado desvalorizado no mercado internacional e é um vinho que aparece no mercado mundial muito em restaurantes mais populares e supermercados, não tanto em restaurantes de topo e em garrafeiras. Este ano isto jogou completamente a nosso favor, porque mesmo nos outros países onde houve confinamento os restaurantes fecharam, mas os supermercados continuaram abertos e nós estamos lá. Reparem que nós temos uma marca de Vinho Verde na Alemanha que faz três milhões de litros numa rede nacional de supermercados. Isso não parou. O que parou, tal como aqui, foram restaurantes e estabelecimentos de cidade. Em Portugal, a economia dentro da região está com alguma força, mas as zonas de Porto e Lisboa estão muito difíceis e isso reflecte-se na restauração dessas duas cidades.
Ano recorde nos rosados
P - Fechou-se o Verão. Abre-se o horizonte para o tempo mais frio. Que balanço podemos fazer até à data de vendas de vinho verde?
R - Este foi um ano imprevisível. Janeiro e Fevereiro começaram muito bem. No início do ano estávamos com vendas nacionais e exportações muito fortes. Claro que a partir de Março começaram a piorar. Abril, Maio e Junho, sobretudo estes dois últimos meses foram muitíssimo difíceis. A partir daí temos vindo a recuperar e julgo que toda a economia também.
No que diz respeito aos vinhos brancos estamos um bocado acima do ano passado, ou seja, já recuperamos as perdas. Nos vinhos rosados estamos acima do ano passado, que são a grande estrela das vendas desde ano. Estamos abaixo nos tintos e sobretudo naquele segmento de maior valor - alvarinho, loureiro. E tivemos um rombo grande nos espumantes de vinho verde, mas aí teve todo o sector dos espumantes. Julgo que podemos fechar o ano quase em valores do ano passado, mas vamos ver como é o último trimestre, como se comporta a restauração por exemplo.
No capítulo da exportação tivemos muitos bons resultados no norte da Europa e nos Estados Unidos da América, mas muito maus em França e no Brasil. França por causa do confinamento, no Brasil a moeda local desvalorizou-se muito.
Em suma, é um ano desigual. Eu acho que a grande chave não é que seja um ano de perdas de vendas, mas é desigual, porque, enquanto que há produtores que estão nos supermercados e na exportação e aí estão a funcionar, os que estão nos restaurantes e nas pequenas garrafeiras perderam muito. Os restaurantes fecharam, têm dificuldades, o movimento da restauração ainda não recuperou a 100 por cento, mesmo os restaurantes que vemos cheios, as salas não têm o mesmo número de mesas e cadeiras que tinham no passado.
P - Apesar de manter esse registo de restaurantes mais populares ou supermercados, o Vinho Verde já entra em locais de maior poder económico. A região está a ganhar maior requinte também?
R - Pelo mundo fora aos poucos. Temos dois segmentos de Vinho Verde. O mais popular, que gera um grande volume de negócio e depois temos um segmento de maior valor, onde está o loureiro, o alvarinho, o avesso, onde está a sub-região Monção & Melgaço. São vinhos que têm uma especificidade e que lhe aportam mais valor. Esses dependem do mercado. Este ano, por exemplo, na Suécia, os Alvarinhos exportaram-se muitíssimo bem. As pessoas estavam em casa, até podiam ir comprar vinhos de maior valor e levar para casa. Suécia, Noruega e Finlândia comportaram-se muito bem. Aqui em Portugal diria que os vinhos de menor valor comportaram-se melhor, porque são os que estão nos supermercados.
P - Encontram-se novos mercados para o Vinho Verde?
R - Nós exportamos Vinho Verde para 104 países. Há vinho verde em praticamente todo o mundo. Alguns muito pouco e outros como Alemanha que já falamos ou os Estados Unidos da América, que vendemos dez milhões de litros. Todos os anos vamos procurando identificar mercados novos. Há cerca de cinco anos começamos a investir no mercado japonês, que era um mercado que praticamente não tínhamos presença, e, actualmente, já vendemos quase meio milhão de litros e vamos continuar a crescer. Este ano tínhamos preparado uma grande campanha para o mercado mexicano. Seria a primeira vez. O confinamento alterou-nos muito os planos, mas não a anulámos. Temos feito na via digital e vamos trazer cá dois grupos. Agora, neste mês de Outubro, vamos trazer cá compradores, importadores mexicanos, que vêm conhecer os produtores e, em meados de Dezembro, virá o segundo grupo, um grupo de jornalistas que vai conhecer a região. O México é um país organizado, onde já temos algumas exportações, é um país que gosta e produz vinho e onde o nome vinho verde funciona bem, porque fala-se o castelhano. Estamos a fazer a nossa primeira experiência com bastante entusiasmo. Estamos a pesquisar os eventos onde podemos marcar presença nos próximos anos, de modo a estabelecer uma estratégia para termos uma presença mais vincada nesse mercado.
P – O México é muito dominado pelo mercado do EUA e pelo perfil de vinho da Califórnia?
R – Temos que diversificar. Ir à procura de mercados de valor. O mercado mexicano é muito dominado pelos norte-americanos, como é evidente. Eles não conhecem os nossos vinhos. E estão muito habituados a esse perfil de vinhos da Califórnia. Primeiro temos que lhes explicar onde está Portugal no mapa e vamos levar vinhos como um bocado menos de álcool, com menos calorias, como são os nossos, mas ao mesmo tempo vinhos gastronómicos. Ou seja, vinhos diferentes daquilo que eles têm dos americanos e, para quem pretender descobrir novos vinhos, vai descobrir vinhos excelentes no Vinho Verde.
P – A uva alvarinho planta-se na Califórnia, mas os nossos têm um perfil totalmente distinto….
R – Já estivemos inclusivamente na Califórnia com produtores e vimos as vinhas de alvarinho. Não são muitas, mas lá estão e fazem os seus vinhos. Provámos e são muito diferentes dos nossos. O alvarinho que se faz na Califórnia é mais 'chato', sem grande alegria, sem grande frescura, tem muito álcool e muito corpo. Cansa depressa e aí os nossos são muito diferentes. Cada região demarcada tem os seus vinhos muito moldados pelo clima, pelos solos, pela casta naturalmente, e esperamos que esse mercado enorme, como é o mexicano, possa absorver os nossos vinhos.
P – O alvarinho que tornou-se na uva mais cara do país...
R – É verdade. O alvarinho de Monção & Melgaço é pago acima de um euro por quilo. Quando vamos ao supermercado comprar uvas para comer pagámos 2.50 euros a 3 euros por quilo. Não damos conta mas um agricultor, na melhor das hipóteses, recebe um euro por quilo. Mas isso é o alvarinho, porque se formos para outras uvas, são pagas ao agricultor entre 40 a 50 cêntimos.
P – Isso diz bem do valor e da procura do alvarinho?
R – Em Monção & Melgaço tem havido imenso plantio de vinha, a vinha tem sido muito bem tratada e é porque as uvas são bem pagas.
P – Há um crescente interesse de produzir vinhos mais complexos, isto é, brancos para guardar. Isso acrescenta valor à região?
R – Ainda estes dias bebi um vinho da região de Melgaço de 2017, que estava muito bom, certamente melhor do que quando foi lançado. O vinho verde não precisa de ser vinho do ano e então quando vamos para vinhos de casta, loureiros e alvarinhos por exemplo, não precisamos de exigir que seja do ano. O vinho tem a ganhar no segundo, terceiro, quarto ano e alguns até mais. Chega até uma década. Esta é uma nova tendência dos vinhos verdes. Se tiver lá em casa uma garrafa esquecida com seis ou sete anos, ao abrir se calhar vai ter uma grande surpresa.
P – Vindima. Estamos na recta final. Que balanço podemos fazer da actual vindima?
R – Foi um bom ano vitícola. Havia muita gente que não ia para o campo, mas por força do confinamento prestou mais atenção à vinha. Tivemos um tempo de míldeo, mas a região sabe tratar bem esta doença e, depois, a partir daí, o ano correu muito bem. Tivemos uvas lindas, dignas de ser fotografadas e tantos produtores as fotografaram e publicaram nas redes sociais. Vamos ter grandes vinhos. A quantidade está um tudo ou nada acima do ano passado, o que nos dá algum conforto, porque dada a situação económica não nos interessava ter uma produção muito grande. Diria que estamos bem no branco, mas não estamos tão bem no tinto e rosado. A região não tem suficiente e estamos a ter um ano de vendas de vinho rosado muito bom. Estamos quase 20 por cento acima do ano passado no rosé e não temos matéria-prima para isso e, por isso, as vendas de rosado vão parar de crescer.
P – Há uma necessidade de a região plantar mais uva tinta?
R – Há. É uma reflexão que estamos a fazer, que a região tem que fazer e á qual tem que dar resposta, que é, nós precisamos de ver uvas adequadas para o rosado, que se calhar não é o vinhão, mas será o espadeiro, o padeiro de basto ou talvez outras. Precisamos também de experimentar e fazer investigação. É curioso que nos últimos vinte anos toda a gente dizia que era preciso plantar uvas brancas, porque o vinho branco era o que dava e agora o ciclo está a mudar e é preciso fazer rosados e tintos.
P - Onde é que podemos situar o rosado na escolha do consumidor?
R - O rosado é mais um vinho de verão, enquanto que o branco vende-se mais ao longo do ano. De facto, é um vinho que tem vindo a crescer muito e nós vendemos mais rosado do que tinto. As nossas gerações também gostam e ganhou uma posição de mercado muito interesssante.
P – Na capítulo do tinto. A região faz muitos tintos ligados à gastronomia, mas falta um tinto para outros momentos. Concorda?
R – Há algumas experiências de fazer tintos diferentes. Temos feito tintos sobretudo para a gastronomia da região e que têm mercado. É um mercado de cinco/seis milhões de litros vendidos na região, com a gastronomia da região. Há algumas experiências feitas por alguns produtores, como o Anselmo Mendes ou a Quinta da Lixa, que nos oferecem tintos diferentes, mas ainda com pouca expressão. Temos que fazer algum trabalho de investigação e temos que pedir também a ajuda da universidade no sentido de perceber que castas é que temos que plantar de tintos. No branco fizemos isso muito bem. Aí pelos anos 80 havia muita dúvida sobre o que se plantar e depois afinou-se bem para alvarinhos, loureiros, avessos, nalguns sítios trajaduras, fizeram-se algumas experiências com fernão pires, mas não se tem plantado mais. Hoje em dia, o loureiro é a casta grande da região, logo seguido do alvarinho e arinto. Nos tintos ainda não chegamos ao sítio certo. Se calhar não pode ser vinhão, ainda por cima para fazer esses vinhos que refere têm que ser castas que deem mais alegria, com menos acidez, menos corpo e vinhos mais abertos. Estamos a fazer algum trabalho na Estação Amândio Calheiros. Há produtores também a fazer. Estou convencido que, quando aparecerem dois ou três tintos com perfis diferentes a terem sucesso, a seguir vão os outros. Isto vai demorar e. vamos estar vários anos com escassez de matéria-prima.
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