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José Maria Costa: ´Foco é garantir que a economia do mar seja competitiva´

Entrevistas

2022-11-16 às 06h00

Paulo Monteiro Paulo Monteiro

José Maria Costa aponta Portugal como exemplo do desenvolvimento de uma economia azul sustentável, defendendo que o oceano é elemento central na procura de soluções para o presente e para o futuro.

Citação

Afinal o que é economia do mar? Quanto vale para Portugal?
A Economia do Mar engloba todas as atividades económicas que dependem do mar, abrange os setores tradicionais como a pesca, o transporte marítimo, o turismo costeiro, mas também setores emergentes como as energias renováveis oceânicas, a biotecnologia azul, a aquacultura, com grande potencial de crescimento económico e inovação.
Em Portugal, a importância da Economia do Mar é medida através da Conta Satélite do Mar, justamente, pelo facto de Portugal ter sido o primeiro país do mundo a criar uma Conta Satélite do Mar, representando um salto muito significativo na informação disponível e colocando Portugal na liderança desta ferramenta de apoio às políticas públicas e ao setor privado.
Os dados mais recentes da Conta Satélite do Mar indicam que o valor da economia do mar tem um peso de 5,1% no Produto Interno Bruto Nacional (PIB) e representa 4,1% em termos de empregos. O valor das exportações associado à economia do mar é de 5% do total nacional, gerando 4,5 mil milhões de euros.
No caso do VAB (Valor Acrescentado Bruto) direto o valor nacional é de 4%, atingindo os 7,2 milhões de euros, o que coloca Portugal em 7.º lugar no grupo de países da União Europeia, à frente de Espanha (3%).

A conta satélite do mar, agrupamentos de atividades económicas ligadas ao mar, está a sofrer alterações constantes: os transportes marítimos, o turismo, as energias, as pescas, a biotecnologia, etc. como vê a evolução nos próximos anos?
Na composição das várias atividades, os
dados revelam um crescimento do peso do turismo costeiro que representa 43,1% do VAB da Economia do Mar. Seguindo-se as atividades da pesca, aquacultura, transformação e comercialização de pescado, que representam 25,1%, sendo o terceiro agrupamento representado pelos portos, transportes e logística (10,6%).
De acordo com a meta definida para o Objetivo Estratégico 2 – Emprego e Economia Azul Circular e Sustentável, no âmbito da Estratégia Nacional do Mar para 2030, Portugal irá aumentar o contributo da Economia do Mar para 7% do VAB da economia nacional. No entanto, pretendemos ir mais além, e acredito que iremos cumprir e superar esta meta, até ao final da atual legislatura.
Em termos mundiais, a economia azul está a passar por uma fase de enorme expansão. Estima-se que o turismo marítimo triplique nos próximos 15 anos. Até 2025, o mercado mundial da biotecnologia marinha poderá ascender a 5,2 mil milhões de euros. Há um enorme potencial para a produção de alimentos e de energias renováveis oceânicas.
A OCDE calculou que a economia azul poderá duplicar até 2030. Para a Europa, isso significaria 10,8 milhões de postos de trabalho e quase 1 mil milhões de euros de VAB.
Face à crise climática e energética, os setores emergentes que mais poderão contribuir para a evolução da Economia do Mar são as energias renováveis oceânicas (‘offshore’ flutuante e ondas), projetos de inovação oceânica e robótica submarina, como a biotecnologia azul, dessalinização, algas e aquacultura, alimentação com base no oceano.
Hoje fala-se muito em Economia do Mar e sustentabilidade. Como podemos fazer uma economia sustentável do mar?
Portugal tem vindo a tornar-se um exemplo de desenvolvimento de uma economia azul sustentável, inovadora, que contribui para a descarbonização europeia e que não gera degradação ambiental do oceano.
A aposta no conhecimento científico do oceano, os esforços de capacitação para melhorar a compreensão de como o oceano e os seus ecossistemas respondem às alterações das propriedades físicas e químicas da água, é um caminho importante para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14.
O oceano é um elemento central na procura de soluções para o presente e o futuro. Para que tal aconteça no respeito da sua integridade em benefício das gerações futuras e dos ecossistemas, há que ambicionar e trabalhar para alcançar um oceano conhecido, saudável e produtivo.
Portugal tem um dos maiores rácios de investigadores em ciências do mar em relação à população total, mais de 300 investigadores empregados por milhão de habitantes, conforme o Global Ocean Science Report, publicado pela Comissão Oceanográfica Intergovernamenal.
Isto permite que as empresas portuguesas disponham de recursos humanos altamente qualificados e conhecimento aprofundado para o desenvolvimento de novas tecnologias para a economia azul, designadamente o desenvolvimento tecnológico de veículos autónomos, numa estreita aliança colaborativa entre a academia, os centros de investigação e as empresas.
O nosso foco é garantir que a Economia do Mar seja competitiva, crie emprego e crescimento económico, respeitando simultaneamente o próprio ambiente de que depende. Num contexto pós-pandémico na UE, o contributo da Economia Azul Sustentável surge como o instrumento fundamental para cumprir os objetivos climáticos e ambientais, em alinhamento com o Pacto Ecológico Europeu e com Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), reconhecendo o papel decisivo que os mares e oceano desempenham no combate e mitigação às alterações climáticas.

Portugal vai investir em centros de investigação e de desenvolvimento de produtos para a economia do mar no Algarve, Lisboa, Oeiras, Peniche, Aveiro e Porto. O que se espera deste investimento?
Na Componente Mar do PRR, já se encontram aprovados 87 milhões de euros destinados a infraestruturar a Economia Azul Sustentável, através do investimento no Hub Azul com a criação e a dinamização de oito polos operacionais distribuídos pelo território nacional (que se constituirão como um verdadeiro ecossistema de infraestruturas em rede) e um polo exclusivamente dedicado à gestão da rede e do modelo de negócio, com competências para a economia azul.
O que está aqui em causa é dotar as infraestruturas portuárias de espaços vocacionados para desenvolver e testar tecnologia, desde operações e atividades marítimas até à monitorização e vigilância do espaço marítimo. A aposta passa pelo conhecimento e pela experimentação em rede, para gerar efetivamente inovação, capaz de catalisar novas oportunidades de negócios decorrentes das transições climática e digital.
Acreditamos que estes investimentos vão contribuir para cumprir um dos compromissos assumidos no âmbito da Segunda Conferência dos Oceanos das Nações Unidas no que se refere à duplicação do número de startups na economia azul, bem como ao número de projetos apoiados por fundos públicos. 

Como é que nós podemos manter uma atividade da pesca sem colocar em causa os stocks peixeiros num futuro próximo, como é que nós podemos desenvolver o turismo costeiro sem colocar uma elevada pressão humana nessas áreas?
A fórmula está no desenvolvimento destas atividades de forma sustentável, dentro dos limites regenerativos dos ecossistemas, uma vez que é fundamental des- carbonizar a economia, desenvolver processos de produção mais limpos, combater a poluição e tornar a economia mais circular, assente em modelos de negócio sustentável, alcançando o cumprimento das metas europeias. No que toca à pesca, cerca de 33 % dos stocks de pesca do mundo, especialmente em níveis tróficos mais elevados, atingiram níveis biologicamente insustentáveis, devido a práticas de sobreexploração, em particular de espécies ameaçadas, com degradação contínua dos habitats. No entanto, existem exemplos muito interessantes de modelos de governança adequada, através de contratos cogestão, com resultados positivos na recuperação dos stocks sobreexplorados. No que diz respeito ao turismo, existem práticas de turismo sustentável que são bastantes conciliadoras com os objetivos de preservação dos recursos onde se desenvolvem, sendo objetivo deste Governo desenvolver um turismo náutico de baixo carbono, garantindo que as marinas sejam eletrificadas e neutras carbonicamente.

Foi autarca em Viana do Castelo sempre olhou para o mar como uma oportunidade?
Olhar o mar da escala local, regional, nacional ou internacional são todas as dimensões integradoras do maior elemento de coesão que é o mar! Na atualidade, poucos temas em Portugal são tão consensuais como a importância do mar para o desenvolvimento do país. Todos os agentes políticos e da sociedade reconhecem a relação especial que temos com o oceano e o seu papel histórico na prosperidade e bem-estar dos portugueses.
A construção da nação portuguesa está intimamente ligada ao oceano. O oceano foi o meio da expansão portuguesa no século XV e é precisamente esse aspeto que confere a Portugal uma marcada visibilidade no mundo enquanto nação eminentemente marítima. Particularmente, a geografia e a localização de Viana do Castelo na fachada Atlântica muito contribuíram para o desenvolvimento da cidade como destino de excelência de energias renováveis e de investimento das tecnologias oceânicas, de alto valor acrescentado e de criação de postos de trabalho qualificados. Portugal pode olhar para o futuro com muita confiança, dado o potencial de crescimento da economia do mar e as vantagens competitivas que pode oferecer. Acredito que o oceano vai ser a força económica desta década, oferecendo vastas oportunidades para a inovação, o empreendedorismo, o investimento e o desenvolvimento de novas profissões e carreiras azuis. Para realizar este potencial, todos os setores da economia do mar – dos mais tradicionais como a pesca e o shipping, aos mais modernos, como a bioeconomia azul ou as energias renováveis oceânicas – estão convocados para a criação modelos económicos resilientes, com inovação e tecnologia e com uma atitude respeitadora para com o uso sustentável do oceano.

Em abril de 2021, ainda presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo propôs desenvolver, a Agenda para a Economia do Mar, com o objetivo de captar 500 milhões de euros de investimento público e privado ao longo da próxima década, promovendo a criação de 1.000 postos de trabalho, numa “previsão conservadora, mas realista”. É fundamental uma estratégia autárquica para o Mar? Qual o papel dos autarcas?
As estratégias municipais, intermunicipais e regionais para o Mar fazem todo o sentido enquanto diagnóstico dos territórios, assentes em processos participativos com a comunidade local e alinhadas com os instrumentos de política pública à escala nacional, como a Estratégia Nacional para o Mar (ENM) 2030.
A estratégia nacional foi elaborada tendo por base a importância do conhecimento científico, a proteção do oceano, a valorização dos serviços dos ecossistemas marinhos e o reconhecimento do seu papel como vetores de desenvolvimento sustentável e, em paralelo, a robustez dos setores tradicionais e emergentes da economia azul.
A ENM 2030 visa potenciar o contributo do mar para a economia do País e o bem-estar dos portugueses, e dar resposta aos grandes desafios da década, reforçando a posição e visibilidade de Portugal no mundo enquanto nação oceânica.

Viana do Castelo terá um parque de energia eólica flutuante com 30 turbinas, como se atraem investimentos privados, e projetos deste nível?
Acompanhei a implementação do projeto WindFloat Atlantic, desde a sua génese, enquanto presidente da autarquia de Viana do Castelo, tanto no âmbito das atribuições cometidas ao município, ao nível do licenciamento municipal, como na componente de envolvimento da comunidade local (autoridade portuária, indústria pesqueira, incluindo o foco na comunidade educativa: escolas e centros de formação e foco na proteção e melhoria da biodiversidade). Trata-se de um projeto emblemático, desenvolvido pela engenharia portuguesa e construído nos estaleiros da Lisnave, em Setúbal, e da Navantia, em Ferrol. O desenvolvimento e a implementação deste projeto demonstraram que a tecnologia de produção de eletricidade a partir de energia eólica offshore pode ser explorada comercialmente e com resultados que agora se verifica superarem as melhores expectativas iniciais.
O interesse crescente por parte de vários investidores estrangeiros, atraídos pela maturidade da tecnologia testada e instalada ao largo de Viana do Castelo e pelos bons resultados entretanto obtidos, é a prova de que as energias renováveis oceânicas terão um papel determinante para a transição energética e para a afirmação de um modelo de desenvolvimento sustentável.
O Governo português assumiu publicamente, no âmbito da Segunda Conferência dos Oceanos, o compromisso de atingir uma capacidade instalada de eólico offshore de 10 GW em 2030.
Para concretizar este objetivo, o Governo criou um Grupo de Trabalho para definir as áreas preferenciais para a exploração de energias renováveis offshore e a sua interligação à Rede Nacional de Transporte de Eletricidade.
Este Grupo de Trabalho irá, ainda, avaliar as necessidades de desenvolvimento das infraestruturas portuárias, tendo em conta, tanto a interligação dos centros electroprodutores, na interface mar/terra, como o desenvolvimento de uma fileira industrial que suporte o desenvolvimento desta cadeia de valor.
No campo da inovação e do desenvolvimento tecnológico, Portugal também está a desenvolver uma Zona Livre Tecnológica (ZLT) para as energias renováveis oceânicas, a localizar em Viana do Castelo, enquanto local de excelência para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras, teste de protótipos no mar e promoção das relações com a indústria da construção naval.
Este tem sido o caminho trilhado pelo Ministério da Economia e do Mar, em articulação com os organismos do setor público e privado, para atrair investimentos na área da economia azul sustentável, dispor dos instrumentos legais ao nível do ordenamento e licenciamento do espaço marítimo, captar os financiamentos de fundos nacionais e europeus que permitam estimular a instalação de projetos inovadores, melhorar as qualificações e competências técnicas na área marítima, estabelecer a ligação com sistema científico e de investigação, nomeadamente através da criação de uma task force para o Mar.
Importa notar que as áreas de atuação da task force para o Mar estão alinhadas e visam concretizar os objetivos da ENM2030 e respetivo Plano de Ação e os objetivos inscritos no Programa do XXIII Governo Constitucional, bem como os objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 das Nações Unidas. Esta iniciativa congrega representantes de várias entidades públicas e privadas, com o objetivo de aprofundar o relacionamento com a indústria, as universidades e os centros de investigação, para reforçar os clusters empresariais e tecnológicos existentes e identificar novas oportunidades na economia azul nas áreas definidas como prioritárias pelo atual Governo.

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