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Semana Internacional dos Arquivos

Fazer Pedagogia da Memória

Semana Internacional dos Arquivos

Voz às Bibliotecas

2025-05-22 às 06h00

Carla Araújo Carla Araújo

Vivemos num tempo em que o acesso à informação deixou de ser um privilégio técnico para se tornar um direito cívico. E, paradoxalmente, é também neste tempo – marcado por promessas de modernização e eficiência – que esse direito pare- ce mais ameaçado.
No próximo dia 5 de junho, no Teatro Thalia, em Lisboa, um evento promovido pela Rede GIC – Gestão da Informação e do Conhecimento das Secretarias-Gerais, no âmbito da Semana Internacional dos Arquivos, propõe um debate funda- mental: o acesso à informação pública em tempos de reestruturação administrativa. Tema denso? Sem dúvida. Mas também urgente, polémico e, até, profundamente político.
Em causa estão duas reformas estruturantes: o Decreto-Lei n.º 43-B/2024, que cria a nova Secretaria-Geral do Governo, extinguindo e fundindo estruturas até agora independentes; e o Decreto-Lei n.º 62/2025, que redesenha a Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas e dá origem ao novo Arquivo Geral da Administração Central. São decisões com impacto direto sobre a gestão documental do Estado, e, por consequência, sobre a nossa memória institucional.
Entre a eficiência administrativa e o direito à informação, onde fica o cidadão? Será esta centralização sinónimo de organização e transparência ou um novo véu sobre os corredores da decisão pública? A documentação digital, por exemplo – essa criatura frágil da era moderna – terá garantias de preservação a longo prazo? E os arquivos em papel, esses que continuam a conter verdades incómodas e histórias mal resolvidas, estarão mais protegidos ou mais distantes?
A verdade é que, neste cenário de transformação, poucas certezas existem. Mas uma é inegável: sem um compromisso firme com a acessibilidade, a preservação e a vigilância cívica, nenhuma reforma é neutra. Porque não se trata apenas de onde se guardam os arquivos, mas de quem os pode consultar, de como se garante o seu futuro e, sobretudo, de quem responde quando a história tenta ser esquecida.
Os arquivos são mais do que depósitos de papel – são instrumentos de cidadania. E qualquer ameaça ao seu acesso é, no fundo, uma ameaça ao nosso direito de saber. Por isso, este debate é mais do que técnico: é profundamente democrático. O convite à presença de profissionais da informação, investigadores, jornalistas, juristas e cidadãos é um dos grandes obje- tivos deste evento. Porque, em tempos de mudança, a transparência não pode ser opcional. Tem de ser uma exigência.
Em jeito de encerramento desta crónica, importa reforçar que a comemoração, entre os dias 9 e 13 de junho, da Semana Internacional dos Arquivos é, antes de tudo, reconhecer o valor da memória como um bem público. É um momento que ultrapassa o campo profissional dos arquivistas e convida toda a sociedade a refletir sobre a importância de proteger, aceder e compreender os registos que documentam as decisões, os erros e os avanços das instituições. Numa era de desinformação e de ocultação seletivos, os arquivos são mais do que passado — são ferramentas para a justiça, a cidadania e a responsabilidade democrática. Celebrar esta semana é, portanto, reafirmar o compromisso com a verdade e com o direito de todos a conhecê-la.

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