Assim vai a política em Portugal
Ensino
2023-09-27 às 06h00
O título não tem nada de novo que não tenhamos apercebido antes e, até, sentido na pele. Mas é um facto que, desta vez, tem expressão europeia pois, segundo o barómetro europeu, publicado pela IPSOS (disponível em https://www.ipsos.com/en/29-europeans-say-they-are-currently-precarious-financial-situation), metade dos portugueses não ganha para as despesas. Na minha opinião, e vale o que vale, esta noção é grave, na medida em que este cenário passa-se no “país dos festivais”, considerando que estes sobrepõem-se, em termos de datas, e encontram-se sempre cheios (com uma elevada taxa de consumo por nacionais). Considerando estes dois aspetos, conseguimos perceber as disparidades salariais no posso país e perceber as definições de prioridades dos cidadãos (considerando que há bilhetes para festivais que dão pontos para compra em supermercado ou que permitem a compra parcelar - há festivais, para 2024, que já estão a vender bilhetes com “suaves” prestações mensais).
Em bom rigor, este artigo recai sobre o primeiro Barómetro Europeu sobre Pobreza e Precaridade, divulgado a 6 de setembro de 2023. Este é o primeiro barómetro, mas não é a primeira vez que os seus dados são revelados. De modo geral, o documento revela que a situação das pessoas empregadas, em Portugal, é preocupante, colocando-nos mesmo ao nível da Sérvia. Caso tenha mais curiosidade, recomenda-se a consulta do artigo da CNN (https://cnnportugal.iol.pt/barometro-europeu-sobre-pobreza-e-precariedade/portugal/muito-preocupante-barometro-europeu-conclui-que-salario-de-metade-dos-portugueses-empregados-nao-chega-para-as-despesas/20230906/64f81b36d34e65afa2f5087a).
Agora, em termos de análise, o documento refere que um em cada dois portugueses (estamos a referir 50% dos portugueses, note-se bem), alega que não ganha o suficiente para chegar ao final do mês. Segundo Etienne Mercier, autor francês do documento, considera que, extraído dos dados do documento, a maior parte dos inquiridos considera que “ter um emprego não significa, necessariamente, ser capaz de sobreviver financeiramente”. Este é um dado muito preocupante e, atualmente, há jovens que, devido aos baixos salários e associado à precaridade profissional, vê-se obrigado a ter mais que uma atividade profissional para poder honrar com os seus compromissos. Nesse universo, há quem, em supermercado, só escolha artigos em final de prazo (mais baratos), há quem não obedeça às regulares três refeições por dia (saltando entre refeições) e há quem tenha desistido de aquecer a casa no inverno, apesar do frio, porque não conseguem pagar as faturas. Isto tudo para não referir que o luxo de “férias” (ao preço que as coisas estão, ir para onde? É a questão que fica no ar) não é considerado. Este resultado é mesmo preocupante, considerando que se trata de um questionário conduzido junto de 10.000 europeus, espalhados por 10 países, nomeadamente, Alemanha, França, Grécia, Itália, Polónia, Portugal, Moldávia, Reino Unido, Romania e Sérvia, durante o mês de junho/2023 (entre os dias 7 e 27). O resultado destes inquéritos traduz-se no facto que a maioria dos europeus acreditar que o seu poder de compra reduziu ao longo dos últimos três anos (pp.21), tendo mesmo sido agravado com a pandemia e suas consequências, para além de outros fatores externos. Neste universo, 55% dos portugueses considera que o poder de compra foi gravemente afetado. A grande maioria dos inquiridos considera que o aumento dos preços é a forte razão para a perda de compra (pp.22) e 3 em cada 10 dos inquiridos considera que vive em situação em precária situação financeira e com parcas condições materiais (pp.23). Na generalidade, o sentimento de falência (ou risco financeiro) é grande, apesar de se revelar com dados inferiores aos referidos em 2022 (pp.24). Para os europeus, as pessoas em situação precária é, agora, visível a terceiros, sejam esses vizinhos, familiares, círculo fechado de amigos e ou colegas de trabalho (pp.25). Conforme já referido, os inquiridos consideram que ter um trabalho não é garantia de ter uma situação financeira confortável, sendo que um terço dos inquiridos considera que um emprego, precário ou não, não garante a manutenção das suas despesas básicas (pp. 26), obrigado a outras opções de trabalho. Para além do embaraço social, as limitações financeiras, nos últimos 6 meses, afetaram muitos europeus, dos quais, pelo menos, 1 em cada 5 teve de pedir ajuda financeira a amigos ou familiares. A situação é tão grave que mais de um terço dos pais com jovens em idade inferior a 18 anos encontra-se impossibilitado de satisfazer as necessidades básicas das suas crianças (pp.32). É muito grave e só para ter uma ideia, a maioria dos europeus inquiridos respondeu que não é capaz de efetuar poupanças, de qualquer espécie (cerca de 57%) e mais de 1 pessoa, em cada 5, não consegue chegar ao final do mês sem ultrapassar a “linha vermelha” do descoberto em conta (cerca de 21%). Estes números deveriam preocupar todos nós. Uma pena, mesmo. Quase metade dos europeus está atrapalhado ou preocupado sobre o facto de não ser capaz de pagar as suas contas no final do mês (pp.37).
Por fim, o documento refere que, apesar dos dados indicados (o documento revela mais informação do que a que aqui é partilhada), é um facto positivo que mais de ¾ dos europeus inquiridos afirma-se disposto a envolver-se, pessoalmente, no processo de ajuda aos que se encontram em situação difícil ou carente (pp.37). Aqui, a minha “parca” experiência revela que há um hiato enorme (diria mesmo, grande, um foço) entre as palavras e a ação. Na realidade, apesar de haver quem afirme estar disposto a ajudar, essa ajuda nunca surge porque, pelo meio, outras prioridades se levantam. Resumo que há muito poucos a darem um passo em frente e fazerem a diferença ajudando, de facto, as pessoas mais carenciadas. Nas minhas ações, já encontrei quem o tivesse feito para disfarçar a sua condição e ir ficando com algumas coisas para si (este facto está rotulado como “pobreza envergonhada”).
O tema deste artigo não é agradável, mas considero que optar pela técnica da avestruz (enfiar a cabeça na areia e esperar que a tempestade passe) não é solução. Assim sendo, fica a proposta de reflexão dos números e o desafio para juntos fazermos a diferença.
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