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Braga, quarta-feira

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Por não me servir o silêncio cúmplice

António Braga: uma escolha amarrada ao passado

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Por não me servir o silêncio cúmplice

Ideias

2023-09-27 às 06h00

José Manuel Cruz José Manuel Cruz

Quererei falar do Nagorno Karabakh, mas terei de ir ao Donbass. Quererei falar do gás azeri, mas terei de abordar o russo. Quererei falar de um pequeno povo, mas terei de enterrar em misérias toda uma União de acérrimos defensores de valores morais, mas apenas dos que arranjam a quem não tem cara em que colem vergonhas.
Nagorno Karabakh – ou Alto Carabaque, para evitar o russismo – já era Arménia antes de haver Azerbaijão, já era território de mosteiros cristãos, antes de por lá aparecerem mesquitas. Já lá se falava a língua que hoje se supõe erradicada, antes de se falar qualquer variedade de turco. Nos últimos 30 anos ninguém com autoridade quis por os pontos nos ii’s. É natural que quem o fez sacuda todo o odioso.
Tem Portugal o exemplo tristemente ilustrativo de uma descolonização atamancada. Tem a URSS cessada e a Europa vigente as pendências de uma desagregação feita às três pancadas, porque menos interessasse pensar o novo do que arrumar de vez com o velho, com o que nunca deveria ter existido, valendo a ilusão de que pudéssemos enfim regressar às vésperas da Revolução de Outubro e varrer sem rasto setenta e tal anos de História.
O problema é que muita coisa tinha acontecido entretanto. É em nome do que aconteceu e que não se reviu na desagregação da URSS, com a correspondente fundação de novos estados, que hoje estamos com os problemas entre russos e ucranianos no Donbass e na Crimeia, que hoje estamos com problemas no Alto Carabaque.
Dispuseram os líderes soviéticos, como despacha quem resolve objecções com deportações, ou pior. Stalin, que era georgiano, e que como tal não podia ver os arménios, expropriou-os de uma tranche dos territórios ancestrais, em favor de azeris, por quem tampouco teria apreço, mas isso já de pouco relevo seria. Ora nós, que pelo tirano vermelho temos o mais colorido asco, com todos os silêncios nos baldamos para a reposição de um direito espezinhado. Próximo ou similar operou Krustchiov em 1954, transferindo a Crimeia da República Russa para a República Ucraniana.
A História é bem mais do que isto, mas não cabe toda aqui, como sequer cabe a que esboço em cabeças que pensam com o porta-moedas.
Começa a guerra e vá de vetar e de sabotar o gás russo. Por Alemanha tão do seu peito, Úrsula que vai em missão pedinchona discutir abastecimentos de substituição com azeris, e ainda por estes dias se vangloriava de ter conseguido dobrar o abastecimento. Azerbaijão que terá acedido, também em troca de uns olhares para o lado, quanto a essa questiúncula do Carabaque. Aliás, não é de agora que se fala da diplomacia do caviar, das gratificações generosas aos amigos do presidente Ali.
Ironia que muito me custa referir, mas não é certo que o gás que Úrsula compra não seja russo à metade, ou em torno disso, vendido acima do que custava o entregue pelo Báltico.
Gás posto de parte, talvez quiséssemos acudir aos arménios do Carabaque, o problema é que isso validaria as pretensões russas noutra geografia. Talvez o quiséssemos fazer, só que pelo meio compactuamos com a amputação de uma parte do território ancestral sérvio em favor dos albaneses do Kosovo. Isto não é fácil de encontrar gente séria.
Entretanto agenda-se um encontro negocial para Outubro, com alemães e franceses distantemente envergonhados entre os mediadores. Não foram Hollande e Merkel que em 2013 ajudaram à missa negra, de que viria a resultar um estremar sem fim entre russos e ucranianos?
Anjos da guarda, ou ò da guarda?

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