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Braga, terça-feira

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O que mais me gratificou profissionalmente este ano?

A responsabilidade de todos

O que mais me gratificou profissionalmente este ano?

Voz aos Escritores

2022-12-30 às 06h00

Fernanda Santos Fernanda Santos

À primeira vista, parece fácil escrever sobre este tema dada a quantidade de acontecimentos relevantes em que nos envolvemos ao longo do ano que agora termina. Contudo, o que mais me gratificou profissionalmente este ano foi o poder exercer a profissão sendo eu própria, com as minhas fragilidades, com as minhas incertezas, com as minhas interrogações, com verdade. É que num mundo de aparências, feliz é aquele que vive de verdade, pois ninguém consegue “voar” com asas frágeis e quebradiças e sem garantias de condições de trabalho atrativas que, por sua vez, possam assegurar a permanência no sistema de um corpo docente qualificado e motivado.
Reiterei, ao longo de mais uma caminhada, a necessidade de afirmar-me como uma professora capaz de atender às demandas do século XXI, encarando o desafio da aprendizagem não como a aquisição do conhecimento, mas fazer com que o aluno consiga dar sentido às coisas. Fui repensando o papel do educador na contemporaneidade, porque hoje as tarefas do professor são muito diferentes do que eram no passado. Os professores e as escolas não podem viver um mundo que já não existe. A geração de hoje não comunica, não pensa e não aprende da mesma maneira que as anteriores.

Os novos alunos têm outras maneiras de estar na vida, de aprender, e nós temos de nos adaptar para não criarmos um fosso geracional. Pretendi sempre mobilizar esforços e agir no sentido da redução de problemas, através da aprendizagem e estilos alternativos de aquisição do conhecimento. Tento ser empática com os meus alunos, refletindo sobre a minha própria aquisição do conhecimento no passado, onde aprendia um conceito para depois o comunicar a seguir, nomeadamente nas línguas, ao contrário de hoje em que é no próprio processo de comunicação que se gera aprendizagem e conhecimento.

A desmotivação faz parte deste processo de aprendizagem e deve ser colmatada dando espaço aos alunos para aprenderem com os próprios erros, não tendo receio de experimentar e errar. Por isso, tento olhar para a comunicação não como indisciplina, incapacidade ou para o aluno, que está disperso a fazer coisas que não as que pedimos para fazer, utilizando a meu favor esse potencial de comunicação. Isso implica um conjunto de adequações metodológicas no ato da criação em que se dá a dinâmica da aprendizagem em si, seja na sala de aula, seja na biblioteca ou num qualquer “palco” educativo. Mas é claro que não se cria em cima do nada, não se cria no vazio, mas a partir de um conjunto de atividades motivadoras de aprendizagens significativas.
A minha luta é a de sempre, a escola de hoje tem de conseguir atender a estes novos desafios, pois a sala de aula como único espaço de aprendizagem tende a desaparecer.

Precisamos de uma escola enraizada na sociedade, nas suas diferenças e que, por isso, consiga construir projetos distintos e escolas diferentes. Precisamos de escolas que sejam o oposto da normalização, do “tamanho-único”, de que nos fala o Professor João Formosinho, e possam atender à diversidade. Foi com esse espírito, de entender o meu papel no processo de mudança de paradigma de aprendizagem, que procurei saber o que faz falta a um aluno, ao invés de o empurrar para fora da escola, usando esse diagnóstico constante em prol da inclusão e da capacidade de “ensinar” as crianças que não têm projeto escolar inscrito no seu percurso de vida. E assim nascia, dia após dia, uma vontade imensa de os retirar das quatro paredes da sala de aula e de os levar a procurar inspiração na arte de comunicar.
Embora (sendo) outono, cheirava a primavera, o sol estava radiante e os pássaros pareciam cantar alegremente, encurtando os silêncios que brotavam dos olhos da diferença, marcando a sinfonia de letras que havia de surgir a publicação “Galécia fora de portas”, com ilustrações de duas alunas do ensino articulado da dança, a Daniela e a Lívia.

A quietude do momento foi abalada com a campainha que convidava a uma breve pausa poética. Parecia estar no meio de um campo de papoilas que acenavam em todas as direções, soltando no ar o perfume dos verdadeiros poetas. Por momentos, pensei ouvir Fernando Pessoa pegar-me gentilmente pela mão, lembrando-me que “às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.” Deste modo, justificava-se a dinamização de uma atividade voltada para o meio, para a cidade de Braga, um momento cultural na BLCS, com a participação animada dos alunos do AEMaximinos. Apesar do temporal desse dia, a música e a dança completaram lindamente a sinfonia das letras e das artes.
E, hoje, mesmo no final do ano, sinto que cuidar do aluno é cuidar da sua aprendizagem e sentir-me grata por isso, porque o que nos gratifica pode-nos fazer voar…

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