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O fim da filosofia

As emoções no outono

O fim da filosofia

Ideias

2022-11-19 às 06h00

José Augusto Lopes Ribeiro José Augusto Lopes Ribeiro

Num mundo preocupado com a utilidade e com o lucro, a crise das Humanidades é uma “crise silenciosa”, o único pensamento que importa é aquele que produz resultados. O ser humano está obcecado pelo progresso tecnológico e acredita cegamente na digitalização da existência e do próprio Homem. Não discutimos as implicações negativas dos meios tecnológicos enquanto agressão da natureza e da nossa própria humanidade. Também a educação e a escola sofrem a pressão pela competição e pelo rendimento e a finalidade é que os alunos se tornem uma espécie de “máquinas utilitárias”.
A metamorfose inquietante que abala as nossas sociedades provoca uma vertigem que nos torna mais conformistas em relação à tecnologia e indiferentes em relação aos outros. Agora aquilo que conta é o planeamento e a automatização, em nome da promessa de uma nova felicidade. Deste modo, estamos dispostos a desvalorizar a educação humanista e a desacreditar da Arte, da Literatura ou da Filosofia, dimensões que nos fazem humanos. Assistimos, pois, a uma atrofia da alma, procuramos a eficiência, a rentabilidade e o êxito, mas desprezamos aquilo que tem a ver com as Humanidades.
Uma nação que se preocupe com o desenvolvimento humano e com a formação de cidadãos ativos deve promover os valores democráticos, nomeadamente a liberdade de pensamento e o respeito pelos outros. Mediante o cultivo das disciplinas humanísticas, como a Filosofia, os indivíduos habituam-se a valorizar a reflexão, a imaginação e o pensamento crítico. Assim, em vez de desvalorizar a Filosofia e de anunciar o seu fim, este é o momento para reconhecer a sua importância e o papel que pode desempenhar na educação e na escola.
Cabe à Filosofia estimular os indivíduos para analisarem os seus pensamentos e as suas emoções. Através do questionamento e da crítica, os alunos adquirem uma compreensão integradora do ser humano e desenvolvem a empatia, alargando a sua capacidade de pensar como seria estar no lugar do outro. O modelo de mercado encara a escola como uma empresa e o aluno como cliente, valorizando apenas a dimensão técnica e rentável e promovendo o corte progressivo nas áreas das Humanidades. Contudo, os seres humanos não devem ser reduzidos a mera mão de obra para fins económicos, as pessoas têm necessidade de compreensão e de sentido. Sócrates declarou: “uma vida não examinada não merece ser vivida”, para o filósofo grego o mais importante é estabelecer uma continuidade entre o pensamento e a própria vida, pela reflexão adquirimos o hábito de conversar connosco próprios, de maneira a viver uma existência humanamente significante. Enquanto seres pensantes temos necessidade de procurar um sentido e, por outro lado, devemos perceber essa significação pensando por nós mesmos e cultivando o espírito crítico, de maneira a descobrir um antídoto para as tentativas de manipulação que proliferam por toda a parte. A Era Digital promove uma servidão voluntária, agora somos nós os artesãos do conformismo, da indiferença e da limitação das liberdades. Estamos distraídos pelas redes sociais e não questionamos a falta de privacidade e a vigilância permanente. Fugimos da realidade pelo divertimento e pelo prazer que encontramos nos ecrãs e as nossas conversas já só reproduzem aquilo que ouvimos na televisão. Não enfrentamos os verdadeiros problemas, somos uns “proletários digitais”.
A Filosofia tem o imperativo moral não só de diagnosticar o mundo, mas de tentar ajudar a reparar, em nome de uma verdadeira ecologia das ideias. A crise em que estamos imersos requer uma profunda reflexão de carácter filosófico, os cidadãos necessitam de recuperar algum controlo e de combater a manipulação e o populismo. Para Heidegger “o Homem atual está em fuga do pensamento”, na perspetiva do filósofo a crescente ausência-de-pensamentos assenta num processo que corrói o âmago mais profundo do ser humano. Por isso, temos necessidade do poder unificador da Filosofia, temos de agir sobre nós mesmos e parar para pensar.
A nova geração precisa, urgentemente, de compreender que o pensar acompanha o viver, daí que a educação e a escola tenham a responsabilidade de revelar a importância da reflexão e da compreensão, de maneira a inspirar os indivíduos para o hábito de pensarem por si mesmos, e esse é o verdadeiro fim (objetivo) da Filosofia.

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