Correio do Minho

Braga, quinta-feira

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“O que fazeis do meu mundo?” - Ano II

Os bobos

Escreve quem sabe

2015-12-01 às 06h00

Cristina Palhares Cristina Palhares

Por ocasião do Encontro Nacional das CERCI’s aqui em Braga na passada semana, tive a oportunidade de poder recordar um texto já escrito nesta mesma rubrica, num dia 3 de dezembro, Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, que celebraremos na próxima quinta-feira. Faço-o novamente, pela sua atualidade e pertinência, e de novo dedico a todos aqueles que diariamente lutam por algo que já não era suposto que o fizessem. Relembro uma imagem, que perdurará para sempre na minha memória, e que invoco sempre que tratamos de direitos fundamentais.

Partilho-a convosco - uma criança, com uma lágrima teimosamente rolando cara abaixo, pergunta-nos (a todos os que a viram e ouviram): “O que fazeis do meu mundo?”.
E a pergunta é dirigida a todos e a cada um, aos governantes e aos governados, aos professores e aos alunos, aos dirigentes e aos dirigidos…, a nós, que agora lemos estas linhas.
“O que fazeis do meu mundo?”

Se a esta pergunta as respostas nos falham, hoje, amanhã e depois correrão com certeza por todo o mundo notícias e imagens que pretenderão dizer o quão preocupados andamos.
Preocupados, porque já em 1994, com a ratificação da Declaração de Salamanca assinamos o compromisso de implementar e desenvolver uma sociedade inclusiva;
Preocupados, porque depois em 1998 a Organização das Nações Unidas avançou com a convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência;

Preocupados, quando Portugal legisla em 1991, apresentando o Decreto-Lei 319 que visaria a integração escolar de todas as crianças com deficiência, flexibilizando a resposta educativa de modo a fornecer uma educação básica de qualidade a todos os alunos;
Preocupados, quando reformulamos o Decreto Lei 319, já no ano de 2008, e apresentamos o Decreto Lei 3.

Preocupados sim… muito preocupados. Mas, infelizmente, a nossa preocupação ainda não responde ao “O que fazeis do meu mundo?”. Se nos colocarmos na posição daquela criança, e lhe fizéssemos essa pergunta “O que fazemos do teu mundo?”, ela daria muitas respostas, estou certa:

“Fazeis um mundo onde ainda estou na última fila da sala de aula, porque perturbo os meus colegas”;
“Fazeis um mundo onde estou na primeira fila porque a minha cadeira de rodas não permite ir além dela”;
“Fazeis um mundo com olhares piedosos, ou pelo contrário, repulsivos, porque o meu corpo não é como o corpo da maioria dos meninos”;
“Fazeis um mundo onde ando de mão estendida porque vivo da caridade”,
“Fazeis um mundo onde…..”; Tantos ondes poderíamos responder. Verdade! Tão verdade como a lágrima que escorre e que quase parece eterna. A nossa preocupação já leva tantos anos. As nossas dificuldades têm tantos anos!!! As nossas respostas demoram tantos anos.

Urge olharmos para a inclusão, que sendo um movimento social é também educacional e político, como um direito de todos os indivíduos participarem na sociedade em que vivem, na sua diferença.
Não é adaptá-los às suas diferenças, não é apagarmos as suas diferenças, é perceber que a diferença é uma mais valia no seu desenvolvimento e que faz deles seres únicos, tal como nós nos reconhecemos únicos. Quanto mais tempo vai passar desde a nossa preocupação para uma resposta efetiva?

Saibamos amanhã poder dizer-lhe: “Fazemos o melhor que sabemos, o melhor que podemos, para ti!”.
E o que sabemos e o que fazemos passa necessariamente por enrolar novamente aquela lágrima teimosa, desta vez, cara acima, transformando aquele rosto sofrido num grande sorriso, porque nós vamos saber e fazer para ela: tal qual ela é!

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