As emoções no outono
Voz às Escolas
2014-12-08 às 06h00
Assim como pilar fundamental do Estado-nação, visões de justiça tornam-se também intrínsecas à construção de outro dos seus pilares, a educação.
No dia-a-dia das escolas, essas visões de justiça estão também sempre presentes e condicionam toda a sua ação, implícita ou explicitamente, formal ou informalmente. Perpassam a ação social escolar, a definição da profundidade e conteúdos dos currículos, a ação em sala de aula, a disciplina, a avaliação…
Sucede que, apesar de tantas vezes convocada e, surpreendentemente, com muita assertividade também, esse invocar da “justiça” não é muitas vezes devidamente refletido. Particularmente porque existem atores que tendem simplisticamente a considerar a justiça como um conceito singular, quando na realidade não o é. Mas sim fortemente plural e, mas do que isso, no cruzar dessas pluralidades, complexo.
Para perceber essa complexidade, basta pensar nas duas dimensões de justiça mais constantemente convocadas em contexto escolar: devemos dar a cada um o mesmo, partindo do princípio de uma pressuposta igualdade de direitos à partida, ou dar a cada um na medida das suas necessidades, procurando uma possível igualdade no final do processo?
Existe ainda uma terceira dimensão, mais radical e menos convocada na busca dessa igualdade à chegada, de inclusive negar a uns o acesso a certas prerrogativas para possibilitar a outros o acesso às mesmas… Indissociável destas visões, está o conceito, também tão presente no processo educativo, do mérito individual. Em que consiste, nesta complexidade, o mesmo?
Em avaliação, esta complexidade na apreciação do mérito concretiza-se, por exemplo, na decisão de se se deve ponderar mais o esforço colocado no atingir de uma determinada meta ou somente o atingir puro e simples dessa meta. Tendo ainda presente que a própria perceção da importância da superação dessas metas e da importância do sucesso educativo varia fortemente de aluno para aluno, estando, na generalidade das situações, fortemente ligada ao contexto sociocultural da família de cada um.
Isto abstraindo-nos de debater a visão de justiça educativa para o Estado-nação ou de qual a intencionalidade que está subjacente à superior definição de metas e da sua natureza. Atentemos na recente introdução de exames nacionais intermédios na escolaridade obrigatória nos 4.º, 6.º e 9.º anos.
Este debate sobre a complexidade de avaliação de uma putativa meritocracia não é exclusivo, em contexto escolar, à avaliação dos alunos. Transcende-se também, por exemplo, à avaliação dos professores e à avaliação das escolas. Sendo por vezes irónico que atores que num contexto convocam um sentido de justiça, noutro clamem pela legitimidade de um completamente oposto.
Assim como complexa é a justiça, também complexo é este debate. Mas, assim como fundamental à identidade do Estado-nação, também para a construção da identidade de cada escola ele deve ser claramente assumido. Particularmente para a Escola Pública, uma escola que - por enquanto e pelo menos no discurso - se pretende para todos.
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