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Fábrica Rito

‘Spoofing’ e a Vulnerabilidade das Comunicações

Fábrica Rito

Voz aos Escritores

2022-09-23 às 06h00

Joana Páris Rito Joana Páris Rito

Este ano comemoram-se os setenta e cinco anos da Fábrica Rito, uma indústria de Braga cuja história se interliga com a saga familiar dos Ritos na harmonia matrimonial dos bem-aventurados, como o foi o casamento dos seus fundadores, António Rito e Júlia Peixoto, mulher astuta, empreendedora como o seu irmão Pachancho, que viu no marido, a quem sempre chamou pelo apelido, Rito, e nos dois filhos mais velhos, o António e o Jorge, os ingredientes essenciais para o sucesso empresarial: engenho, dedicação, ausência de medo em arregaçar as mangas e mãos fadadas para a minúcia habilidosa da mecânica, num tempo em que a indústria motorizada dava os adolescentes passos na conquista do Mundo ávido de modernismo.
Faltava, porém, ao casal Rito, o fundamental: o necessário capital. Júlia fez contas à vida e não se acanhou, meteu os pés de matriarca nortenha ao caminho e solicitou à médica e amiga Ester Vieira oitenta contos de réis emprestados, dinheiro que possibilitou ao casal Rito e aos dois filhos mais velhos, e depois aos dois mais novos, o Fernando e o Carlos, edificar a Fábrica Rito na Rua de Santo André da Cidade dos Arcebispos. O negócio singrou e prosperou, Pai e filhos consertavam e faziam melhorias nos motores das motas que lhes caíam nas mãos desembaraçadas, aguçando o engenho com a sua perspicácia e curiosidade, um trabalho de inovação e competência que chegou aos ouvidos das grandes marcas italianas, que lhes enviavam os motores das motas que produziam para que os Ritos os aperfeiçoassem e adaptassem às corridas disputadas por todo o Mundo. Inúmeros pilotos de motos e de carros bateram recordes de velocidade (recorde mundial de moto em pista de sal USA) e sagraram-se campeões nas competições de todo-o-terreno, velocidade e ralis, graças aos motores e caixas-de-velocidade optimizados pelos Ritos. Inovadores, Pai e filhos fabricaram um motor de motorizada Rito (2 CIL. 50 c.c.), cuja produção em série e comercialização empancou nas sinuosas papelotas salazaristas.
A crescente procura pelos seus serviços de excelência tornou pequena a oficina da Rua de Santo André, onde a rapaziada, nas poucas horas livres, afluía para ver televisão, novidade da tecnologia então apanágio de poucos. Compraram uma quinta em Ferreiros, onde ergueram a morada de família e as novas instalações fabris da empresa. A matriarca Júlia, às sextas-feiras, espionava e auxiliava no despacho das encomendas dos clientes, dizem que deixava o marido e os quatro filhos homens gerirem a empresa, mas dizem também, que quando alguém abordava questões de números, replicava, senhora de si, “Contas é comigo e com o Rito, e debaixo dos lençóis”. A quinta de Ferreiros foi terra de brincadeiras dos netos do casal Rito e Júlia, terra onde a matriarca cultivava o pomar, a bicharada doméstica, a horta e um vasto roseiral que alindava os ramos das moças casadoiras de Ferreiros. Nesta freguesia, há uma rua com o nome de António Ferreira Rito, justa homenagem a um Homem empreendedor e honesto que muito ajudou no prosperar da cidade, cuja palavra, e a dos quatro filhos, dispensava formalismos de papel, palavra tão franca que alguns clientes lhes adiantavam o dinheiro para a compra das matérias-primas.
Os netos deambulavam pela fábrica e brincavam na quinta, colhiam e comiam tomates quentes cortados com facas ferrugentas, fruta madura das árvores, e ajudavam nas vindimas e na adega no pisar do mosto, lambuzavam-se nos lanches da Avó Júlia, as pataniscas e a prova do vinho, e quando se queixavam da zurrapa que lhes amargava a goela, “vózinha, o vinho é azedo”, a Avó Júlia, no seu lendário pragmatismo, respondia-lhes, “ai é, então deitai-lhe açúcar”, nada desperdiçava, a matriarca, até os pregos retorcidos arrecadava nas algibeiras para serem endireitados e reaproveitados, e esta atitude, aliada ao empenho do marido e dos quatro filhos, consolidou a empresa que até ao 25 de Abril de 1974 vendia primordialmente para o mercado nacional. Visionários, confrontado com o decréscimo dos negócios em Portugal, alargaram horizontes, exportando para 17 países, incluindo as peças para o TGV, Metro e Caminhos-de-ferro em França. Há cinco anos, por questões de logística e de vetustez, venderam o prédio na Rua de Santo André e concentraram a produção em Ferreiros. Orgulham-se de ter clientes com mais de quarenta anos numa fidelização que espelha a consideração e o bom nome Rito dos inauguradores, filhos, netos e bisnetos. O fundador manteve a presença na fábrica até ao fim dos seus dias, e quando as pernas lhe emperraram e o peso dos anos e do árduo trabalho o cansaram, colocou uma cadeira em cada departamento da empresa, onde se sentava e vigiava a produção.
Os seus netos Jorge, Carlos Alberto, João e Fernando seguem-lhe as virtudes, a par do bisneto João Pedro, na gestão desta empresa exemplar que já vai na quarta geração. E que venham mais, é o que a família, os bracarenses e Portugal desejam.

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