Ettore Scola e a ferrovia portuguesa
Escreve quem sabe
2021-03-29 às 06h00
Vender na internet supõe o domínio do seu funcionamento, o que implica tempo, conhecimento material específico, mas, também, lucidez para compreender emoções e comportamentos, nomeadamente os que se referem ao comprador. Em contextos específicos como os da presente pandemia, o comprador age em função das suas necessidades de tempo, qualidade e preço do produto e rapidez nas respostas. Não poucas vezes, tenho lido perguntas sobre determinados produtos e o vendedor deve estar muitíssimo bem preparado para responder eficaz e rapidamente a todas elas, sob pena de o interessado saltar imediatamente para outra página, para outro vendedor.
A ideia da «fila», que ainda funciona em locais físicos e que o comprador vai tolerando, perde validade no ambiente nético. Há tempos, fiz uma busca em plataformas de vendas de carros usados. Inferi que tipo de estratégias de venda eram utilizadas, de entre as quais se relevavam a da omissão propositada, da quilometragem, da data do primeiro registo, do preço e das condições de venda, de fotografias esclarecedoras sobre o produto. Em variadas circunstâncias, o potencial comprador perguntava sobre essas omissões, sendo remetido para mensagens pessoais. Por que razão as respostas não são expostas a um público que, quase sempre, irá fazer o mesmo tipo de perguntas? Que sentido tem uma proposta de venda de um carro muito bonito e brilhante por um preço X se é omitida a sua quilometragem? Na compra de um computador, sendo a velocidade de processamento ou a quantidade de memória RAM fatores fundamentais para a sua escolha, que sentido faz a sua omissão no ato de venda? E por que razão se omite? Sabendo-se que o valor de uma moeda da monarquia se determina pela sua raridade e qualidade, que pode ir do regular ao belo e ao soberbo, como se compreenderá a ausência de uma imagem esclarecedora? Tudo se resumirá, penso eu, a questões de ética.
Como se fomenta a nova ideia da intimidade e da indispensabilidade na relação comercial sem problematizar a ética relacional e a moral individual que comandam comportamentos? Como confiar num vendedor que «esconde» as informações mais relevantes em notas de rodapé quase invisíveis, jogando com a boa-fé do cliente e tentando, assim, tirar dividendos de forma enviesada e imoral? A confiabilidade é um fator fulcral no e-commerce, que passa, também, pela rapidez e clareza da resposta a perguntas pertinentes. Vendedor individual que não prove uma atitude moral positiva e inquestionável não vencerá no seu negócio; empresa que se pretenda séria, atualizada e consonante com valores éticos universais, não conseguirá tornar-se indispensável ao comprador, pela simples razão de ter sido, no entretanto da relação comercial, preterida em favor de outra.
O tempo presente, pleno de complexidades, mas, também, de oportunidades, não se compadece com artimanhas. O bem, creia-se ou não, vencerá sempre o mal. Nada como estarmos inequivocamente no lado certo.
*com JMS
10 Outubro 2024
08 Outubro 2024
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