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Escombros do Hospital Pediátrico

‘Spoofing’ e a Vulnerabilidade das Comunicações

Escombros do Hospital Pediátrico

Voz aos Escritores

2024-07-26 às 06h00

Joana Páris Rito Joana Páris Rito

Dez e meia da manhã em Kiev, o estrondo dos mísseis russos soa pela capital da Ucrânia, sirenes, gritos, alarmes, clamores por socorro. Okhmatdyt, o maior hospital pediátrico da Ucrânia, um dos mais importantes da Europa, é atingido. Tecto, paredes, armários, janelas desmoronam nas crianças doentes, nos seus acompanhantes, nos técnicos de saúde pediátrica. Alguns soterrados, outros escapam para o exterior. Sob o medo e o inclemente sol de Julho, dezenas de crianças aguardam refugio, um lugar onde prosseguir os tratamentos dolorosos, invasivos como os mísseis do inimigo cruel, crianças magras, sem sobrancelhas, lenços na cabeça, cadeiras de rodas, sacos de substâncias químicas ao dependuro, assustadas, umas apáticas, outras soltam o medo nas lágrimas, crianças a quem a doença roubou a infância, e o inimigo russo agravou o furto na bruteza impiedosa de uma guerra sem escrúpulos. A população local corre para prestar auxílio, os militares e equipas de socorro médico aproximam-se dos destroços, oferecem ajuda.
Na guerra, o pior e o melhor do ser humano. Acercam-se da ala dos tratamentos oncológicos e doenças graves, a mais afectada pelo míssil.

O cenário é dantesco, o fumo e o calor dificultam as buscas e a prestação de socorro. Homens e mulheres da medicina têm as batas e fardas de trabalho tingidas de sangue. Homens e mulheres ucranianos vestem-se de pó cinzento. Cordões humanos unidos na solidariedade, tijolos de mão em mão, pedaços de metal, troços de mobiliário, peluches ensanguentados, dinossauros de plástico partidos, utensílios médicos quebrados. É urgente resgatar os soterrados. É urgente proteger as crianças doentes.

Depois do choque, da confrontação do ataque, da destruição, depois das lágrimas e da indignação, é tempo de agir, não arredar pé, mexer os braços ainda que feridos, estender as mãos ainda que doridas. Uma mãe, com um filho de dois anos nos braços, chora, protege o menino com um lenço de algibeira sujo de sangue. Outra mãe, que segura a mãozinha da filha de seis anos, menina pálida, sem cabelo, sincroniza-lhe o pranto. Não há pior notícia para uma mãe e um pai do que o diagnóstico de uma doença grave do filho ou da filha. A angústia, a incerteza no futuro, o medo de perderem o que de mais valioso têm na vida, suga-lhes a vida. A falta de saúde dos filhos é o abismo, buraco negro sem fundo, e os tratamentos uma via-sacra percorrida na esperança da cura que dilui os pesares e o medo. O sofrimen- to dos filhos é o maior dos padecimen-tos, crianças guerreiras que lutam pela vida e na inocência na infância sorriem, dão força aos pais, crianças-anjos, seres de luz.

Nenhuma criança no mundo deveria passar pela provação da doença. Milhares de crianças ucranianas, além da enfermidade, sofrem os horrores da guerra, ficam órfãs, amputadas de avós, amigos, familiares e vizinhos.
Os adultos prosseguem na sementeira do ódio. Os russos negam o ataque, afirmam que o hospital pediátrico sofreu o impacto da artilharia antiaérea ucraniana. Um comandante dissidente russo provou que os ignóbeis misseis tiveram proveniência russa. Neste dia, perderam a vi- da quarenta pessoas, duas das quais médicos pediatras. Três centenas ficaram feridas.
As homenagens aos caídos da barbárie bélica prosseguem, flores, velas e peluches jazem nos escombros do hospital pediátrico.

A incompreensão e a dor estremecem os sobreviventes. As crianças são as maiores vítimas das guerras. A impotência dos adultos na sua protecção deixa culpas em quem não devia senti-las. Ouvem-se os acordes de uma melodia. A orquestra actua, tem como pano de fundo as parciais ruínas do hospital Okhmatdyt. Deve estar a tocar a música do Sting, Russions, … we share de same biology, regardless of ideology, but what might save us, me and you, is if the Russions love their children too… se os russos também amam os seus filhos, se os palestinianos também amam os seus filhos, se os israelitas também amam os seus filhos.
Nos infindos conflitos, não existem guerras vencíveis. E apenas os mortos conhecem o fim das guerras.

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