A pandemia, a transição digital e a nova gestão pública
Ideias
2019-12-22 às 06h00
Porque meios atingimos o divino? E de que massa é feito o deus que adoramos ou positivamente negamos? De nula substância, afora as moléculas da superstição, se o refutarmos com afinco, amparados nas bengalas de metade das filosofias e do pleno das ciências experimentais. Das nossas intuições ou sentimentos, na inversa, posto que as provas materiais não abundam, para dizer o menos. Quão primitiva, quão passada de validade é a criatura que se persigna, que ainda vai em rezas e preces? Quão irracional? Posta a questão nestes termos: quão racionais e equilibradas são as facções que entregaram as divindades a necrófagos com entranhas de pedra?
Quantas interpretações suporta o mais banal dos factos? Não é o orçamento virtuoso para o elenco que o propõe, e uma aberração para os corifeus das oposições? Não é o pirata informático um herói e um vilão, conforme as histórias afectam quem seja das nossas simpatias ou antipatias? Se dançamos à corda com lógica de alba a alba, se encolhemos argumentos até à sua total negação, a par de outros que esticamos, até que perdida esteja toda a adesão à realidade, porque retórica e científica transparência um acto de fé, uma crença religiosa, concita as reprovações enojadas de gente culta, enquanto que os análogos menores, clubistas ou similares, se passeiam na via pública, livres de vergonhas fundacionais?
A recato, de que defeitos se despe aquele que os nossos pecados aponta? Se bárbara e repugnante é a tourada, de que qualificativos se alindam séries e filmes com moto-serras e amputações, jogos electrónicos de mimética acção em que chacinamos para lá do limiar da náusea? É fita! – clamarão. É substituição, é sublimação de impulsos, – direi eu, com a psicologia que me resta.
Desencontramo-nos por banalidades, cultivamos discórdias sob a égide de princípios absolutos, que só o são dentro dos limites do nosso clube enfatuado, da nossa seita animada de uma ética parcial, julgada perene para autoconsumo, esquecendo que outros antes de nós viveram a mesma ilusão, chegando a perseguir, a ostracizar, a condenar, quem sentisse, pensasse ou agisse de modo distinto.
Com palavras moldamos o mundo, com palavras nos aproximamos ou afastámos dos outros – e de nós! Quão diferente de «pão» é a palavra «deus»? Quão mais concreta é uma do que outra? Quanto mais dizível é a primeira do que a segunda? Pensamos «deus» desde a alvorada dos tempos, a divinos consagramos esforços analítico-criativos de que conservamos memória milénios volvidos. Precisávamos de deus entre nós, e dissemos que ele viria. Precisávamos de homens com músculo divino, e glorificámos concepções imaculadas. Esqueçamos um certo Jesus, que nasceu ou não nas condições gravadas na tradição. Esqueçamos o que ele disse e propôs. Esqueçamos as deturpações e as perversões orquestradas por criaturas menores e gananciosas, por homens que o «divino» diziam interpretar e mediar, sem que dele tivessem uma centelha. Esqueçamos tudo o que está para trás e concentremo-nos numa questão: a mensagem faz sentido? Dizemos que ele absolveu a adúltera, dizemos que preceituava que amássemos o próximo, que ele trazia esperança e vida aonde imperava o desespero e a morte, que ele fazia com que o pouco parecesse muito, e que a todos bastasse...
Pudéssemos nós, gentes letradas, impregnadas de verdades de bolsa de valores, estar à altura das prédicas de um que nunca existiu! Talvez precisemos que ele não tenha existido, para que a nossa mesquinhez do dia-a-dia não nos envergonhe.
Um bom natal. Sobretudo para quem não o tem.
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