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Das fissuras à ruína

Maravilhas Humanas

Das fissuras à ruína

Escreve quem sabe

2025-03-18 às 06h00

Vítor Esperança Vítor Esperança

A Democracia é um sistema político complexo e bastante frágil porque comporta em si mesmo a sua autodestruição. Através de eleições atribui o poder de governar a alguns dos seus cidadãos, incluindo quem poderá acabar com ela.
A Democracia não se reduz à existência de eleições, mas ao exercício simultâneo de vários poderes que convergem para o mesmo objetivo: Proporcionar a todos oportunidades para serem livres. Livres para escolherem caminhos de vida diferentes num Mundo desigual, tentando proteger os mais frágeis, condicionar os mais ambiciosos, procurar a equidade nas oportunidades e a justa distribuição de benefícios, que nunca serão iguais para todos e garantir a sua segurança.
Tanto ou mais importantes que as eleições é a existência de Instituições sólidas e credíveis que sirvam o exercício do poder, designadamente os Órgãos de Soberania (Presidência, Assembleia e Governo), entre outras as diferentes Instituições Públicas, e com a administração independente da Justiça e Tribunais. Tudo isto suportado no primado da Lei e do Direito Internacional. A Democracia assemelha-se assim a um muro constituído por muitos blocos de pedra diferentes; no tamanho, robustez e posicionamento relativo na sus própria estrutura, que garantam a necessária sustentabilidade, durabilidade e resistência a forças externas e internas. Apesar disso o aparecimento de fissuras podem pôr em causa as suas capacidades, que originem derrocadas, até à sua total ruína, se não forem reparados ou melhorados os problemas surgidos.
Esta imagem de desmoronamento associo-a ao que observo atualmente à gestão política nas Democracias, incluindo a nossa.
Não há Democracia sem eleições. Estas estão cada vez mais a servir para disputas de personalidades entre as lideranças dos partidos políticos e menos para escolher estratégias políticas que os distingam, partidos estes que se apresentam cada vez mais fechados e com continua redução dos seus simpatizantes e militantes. Em vez do debate de importantes assuntos para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, assistimos a lutas pouco dignas de uns contra os outros, guiando-se apenas por uma regra: Estar sempre em oposição tática de derrubar quem governa.
Por outro lado, assistimos ao afastamento dos cidadãos que vão tratando com desdém quem se envolve na política, como esta fosse uma doença e não a nobre causa de gerir o que é de todos, com orgulho do dever de serviço público. Este caminho permite que sejam cada vez menos a escolher quem deve aceder ao poder, invertendo a regra de ouro da Democracia, ou seja, o direito de representação das escolhas da maioria. Pior, passam a usar o voto como forma de protestar, dando oportunidade a quem quer derrubar tudo.
Disto resulta a deterioração dos Órgãos de Soberania. Assisto à perda contínua da sua respeitabilidade, sobretudo a da Assembleia da República. Não se discute com seriedade e credo as importantes matérias que tragam melhoria para o país, preferindo dar relevo a questiúnculas pessoais, parecendo que muitos deputados apenas ali se encontram para dar consolo aos seus líderes, numa obrigação de dizer o piorio das propostas dos outros.
Relativamente às Instituições Públicas, também elas vêm perdendo a sua qualidade, eficácia e respeitabilidade, seja porque os seus dirigentes máximos não são quem mais sabe do que faz, mas quem melhor se dá com quem governa na oportunidade, seja pela pouca exigência que se colavam a si próprios no trabalho, porque o sabem garantido por emprego inamovível. As suas lideranças não procuram a excelência, não procuram a modernização de processos e sistemas, não estudam objetivos de eficiência. Seguem as rotinas dos dias, atirando queixas e culpas para a falta de meios e as responsabilidades para quem lhes esta a cima na organização. Claro que há muita gente excelente e capaz, mas essa não é a perceção da maioria dos cidadãos.
Da Justiça é o que se sabe e comenta. Enrolados no emaranhado das leis e suas inúmeras e doutas interpretações, agarram-se aos prazos e às lacunas e buracos da própria lei, instrumentos bem conhecidos por importantes gabinetes de advogados, não fizessem eles também parte da génese da própria Lei. A Justiça tornou-se complexa e cara, servindo os mais ricos e poderosos, defraudando a credibilidade que resta à Democracia.
Por último, não posso também lamentar como hoje se trata a informação politica. O jornalismo servia bem esse objetivo, mas hoje parece que se perderam no meio da ansiedade de querer viver a espuma do momento e da surpresa do mau. Não se distinguem entre eles, preferindo aparecer nos mesmos sítios, querendo falar dos mesmos protagonistas e com iguais notícias. Estamos sufocados por especialistas e comentadores de tudo e mais alguma coisa. Mais que os factos, interessam a sua interpretação rebuscada nas intenções ocultas.
Vejo tudo isto como graves fissuras na Democracia. Vejo alguns muros a desmoronarem-se visivelmente. Adivinho a ruína do Sistema Politico.

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