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Clima extremo

IFLA Trend Report 2024

Clima extremo

Ideias

2024-09-19 às 06h00

Bruno Gonçalves Bruno Gonçalves

Portugal está a atravessar uma semana brutalmente difícil. Vastas áreas do país, no Norte e no Centro, estão a arder violentamente há vários dias e muitas populações encontram-se ainda sob ameaça direta das chamas. Embora a situação não seja inédita no nosso país, tudo indica que 2024 pode vir a ser um dos piores anos em termos de área ardida e número de incêndios registados. São recordes que ninguém queria ver batidos e que significam um rasto ainda maior de destruição e desolação.
Os nossos bombeiros e proteção civil - assim como alguns cidadãos voluntários - estão a fazer esforços extraordinários para controlar os incêndios e salvar vidas, mesmo quando tal implica arriscar a sua própria. Infelizmente, à hora que vos escrevo, contam-se sete vítimas mortais e dezenas de feridos, incluindo profissionais mobilizados para o combate às chamas. Palavras de respeito, solidariedade e agradecimento são devidas, mas nunca suficientes para as famílias que enfrentam estas perdas.
Em auxílio têm vindo também os nossos parceiros europeus, provando novamente que a união faz a força, sobretudo em momentos de urgência e extrema necessidade. O Mecanismo Europeu de Proteção Civil, ferramenta de coordenação e resposta a desastres naturais dentro da UE, permitiu a mobilização rápida de recursos e equipas de diferentes Estados-membros, aumentando a nossa capacidade de combate aos incêndios. Mas não é só Portugal que está a beneficiar desta ajuda.
Neste momento, vários países da Europa Central e de Leste enfrentam cheias avassaladoras, que já provocaram dezenas de mortos, igualmente potenciadas pelo efeito das alterações climáticas. A crescente incidência de fenómenos extremos (cheias, incêndios, secas, ondas de calor ou frio, etc.) é uma das consequências mais temida, e, quanto mais nos afastarmos do cumprimento do Acordo de Paris e das metas para redução de emissões poluentes, mais vulneráveis nos tornaremos.
Estes dias dramáticos demonstram que a ação climática não é uma mera preferência, mas sim uma absoluta necessidade para assegurar a sustentabilidade do ecossistema terrestre, em particular na qualidade de habitat para a própria espécie humana. Será necessário agir em duas frentes, em simultâneo: na adaptação do território e infraestruturas para as novas tendências (visto que muitas, infelizmente, não se mudam no curto-prazo); e na mitigação das causas, isto é, reduzindo os comportamentos e tendências que agravam as alterações climáticas.
A adaptação climática exige uma abordagem multifacetada, considerando os diferentes setores económicos que operam no território, as condições do ecossistema biológico, assim como as infraestruturas e os recursos humanos disponíveis. No fundo, conhecer as vulnerabilidades e os riscos (que mudam, por exemplo, quando comparamos uma área agrícola com uma área de indústria da celulose), assim como as ferramentas disponíveis tanto para 1) prevenir ocorrências, como para 2) minimizar o seu impacto.
Por um lado, a prevenção que procura evitar que um determinado risco se materialize faz-se através da limpeza de florestas, restauração de ecossistemas naturais, mapeamento e ordenamento do território, com identificação de áreas suscetíveis à expansão do fogo, sensibilização da sociedade para comportamentos de risco. Por outro, reduzir o impacto exige desenvolver sistemas de alerta precoce e planos de resposta, assim como investir em meios de combate à emergência.
Não obstante, se mantivermos a mesma velha economia que nos trouxe até aqui, dificilmente conseguimos equiparar a nossa resiliência à escala dos desafios. A prospeção e predominância de combustíveis fósseis tem de ficar no passado; precisamos de conduzir a nossa economia para um futuro sustentável, com foco na produção de energia renovável, na eficiência energética e na industrialização verde. Esse caminho foi (bem) delineado durante o último mandato no Parlamento Europeu, através do Pacto Verde, agora chegou o momento de levar essa ambição do papel para o terreno.
Portugal é um país com potencial solar, eólico, hídrico, mas também na área do hidrogénio verde - que pode ser uma tecnologia fundamental para colmatar a produção intermitente das fontes renováveis, já que nem sempre faz sol ou vento. E, traduzindo este potencial em acesso a energia mais barata para as pessoas e para as empresas, o nosso país pode ser um dos principais beneficiários da transição e do novo contexto geopolítico, ao possibilitar o desenvolvimento de indústrias sustentáveis que integrem novas cadeias de produção com valor acrescentado.
É verdade que não se trata de uma solução para os fenómenos climáticos extremos no imediato, como é o caso dos vastos incêndios que assolam o país. É verdade que tem custos associados, porque seria mais barato continuar a queimar carvão e petróleo (por agora). Mas não é menos verdade que a transição será um contributo decisivo para mitigar as causas das alterações climáticas e impedir um agravamento desta tendência a médio e longo-prazo. Nem é menos importante que a transição nos permite poupar vidas, ao mesmo tempo que abre perspetivas para uma estratégia de desenvolvimento económico sustentável para Portugal.
Hoje ainda estamos em fase de emergência. As prioridades são o combate aos incêndios e salvar vidas. Mas aos responsáveis políticos exige-se que pensem nas respostas para tornar o amanhã melhor - um verdadeiro sinal de valorização do trabalho dos nossos profissionais de emergência e de respeito pelos cidadãos que choram as suas perdas. Sem aproveitamento e sem negacionismo.

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