A responsabilidade de todos
Ensino
2018-04-25 às 06h00
Querida Leonor, uma das maiores preocupações resultantes do cargo de docência no ensino superior relaciona-se com a necessidade permanente de nos mantermos ativos e atentos às evoluções que surgem, quotidianamente, no mundo académico, científico e tecnológico. Evidentemente que existem muita informações e/ou conhecimentos que se mantêm praticamente imutáveis ao longo do tempo, no entanto, mesmo essas, de quando em vez, sofrem alterações que nos levam a ter uma necessidade, absoluta, de nos mantermos atentos e atualizados às mudanças decorrentes da investigação mais recente.
Evidentemente que, muitas vezes, as forças burocráticas atuam tal e qual como forças naturais (e.g., gravidade) impedindo-nos no tempo de voarmos pela leitura e pesquisa de informação mas depende de nós, inevitavelmente, encontrar-mos estratégias para contornar as dificuldades temporais e procurarmos aquilo que reforça os nossos papéis principais (supostamente): ensinar e produzir conhecimento.
Para além da manutenção de um estado de alerta permanente face à procura pelo conhecimento, a exposição a novas circunstâncias e parcerias podem ser também o garante da maior efetividade no ato do ensino e produção científica. Nestes casos, a internacionalização por via de mobilidades Erasmus, frequência a congressos ou visitas a universidades/laboratórios internacionais podem assumir-se como determinantes para nos apropriarmos de experiências académicas e culturais diferentes que nos façam olhar para a realidade interior de outra forma e procurarmos otimizar processos. Evidentemente que podemos sempre olhar para um copo a meio como sendo meio cheio ou meio vazio. Mas sendo objetivo, o copo está a 50% pelo que existe sempre oportunidade de o encher ou de o esvaziar. Assim, interessa sempre poder olhar para algumas possibilidades de crescimento interior no ensino superior baseado no que são algumas práticas internacionais (que podem ser entendidas como melhores ou piores na medida da subjetividade humana).
1) Mais randomização do processo de ensino: de facto a simetria do conhecimento e a linearidade da transmissão de conteúdos pode, e deve, ser debatida entre docentes. Apesar de alguns passos promissores no formato de ensino no superior falta, ainda, quebrar algumas barreiras no que ao estilo e métodos de ensino diz respeito, bem como, na própria organização dos cursos. Mais programas com unidades curriculares opcionais e frequência de unidades curriculares de outros cursos pode ser um investimento na pluralidade do conhecimento, combatendo a facilidade da especialização. De facto, a especialização é um instrumento que remedeia a necessidade de preencher vagas de emprego a curto prazo mas, a longo prazo, pode vir aumentar a dificuldade do especialista em responder às adaptações e convulsões resultantes das novas necessidades do mercado.
2) Menos avaliação e mais ensino: vivemos numa progressiva esfera compulsiva por avaliações e reavaliações. A atribuição de uma nota ou um valor objetivo constrange o ensino a focar-se no estudo para os testes. Mas, na verdade, qual a percentagem do conhecimento apreendido momentaneamente para o teste que resulta numa aquisição permanente e apropriação das competências base para o exercício da prática profissional? Não seria mais interessante assegurar que o ensino traduz-se na capacidade de o aluno aprender a pesquisar e a resolver problemas da prática baseado na ciência resultando na sua aptidão ou não para a unidade curricular em causa?
3) Mais liberdade e menos controlo: a obsessão pelo controlo conduz, não raras as vezes, à estandardização de procedimentos que, por um lado, auxiliam na resposta a questões iguais e menor erro humano mas, por outro, ao castramento da criatividade. De facto, o ensino baseado em guidelines é altamente limitador da prática profissional e, sobretudo, do reconhecimento da variabilidade inter-individual que ocorre nas profissões que lidam com seres humanos, como as ciências do desporto.
Querida Leonor, evidentemente que, como qualquer opção, não existem soluções perfeitas mas sim as possíveis face ao contexto.
Mas por vezes a reflexão e debate sobre novas opções pode assumir-se como determinante num plano a longo prazo e no crescimento mais assertivo. É por isso que a discussão é sempre mais importante que a ordem/instrução!
14 Março 2024
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