A responsabilidade de todos
Voz às Bibliotecas
2018-03-15 às 06h00
Às bibliotecas, bem como aos respectivos pelouros, e aos seus responsáveis, cabe-lhes um papel de charneira no apoio à publicação e à divulgação de livros de autores locais. São autores, muitos deles desconhecidos do grande público, mas que revelam grande capacidade narrativa, bem como uma linguagem própria, que os faz emergir no panorama literário local e a afirmarem-se como mais-valias na defesa da cultura e do património imaterial da região.
Ainda recentemente, e com o apoio do Município Barcelense, foram publicados dois livros muito interessantes que conjugam a olaria com a literatura e que valorizam o nosso património oral e imaterial: “Barcelos : estórias recontadas” de A. Cunha e Silva (textos) e João Ferreira (olaria) publicado pela “Seda Publicações” e “Barcelos - Galarotes, Diabinhos, Cabeçudos e Apitos”, com CD, de José Fanha (texto), Daniel Completo (música e interpretação) e Cristina Completo (ilustrações), publicado pela “Oficina Canto das Cores”, e que nos revela um conjunto de poemas e canções alusivas à história e olaria barcelenses.
Neste sentido, exemplo paradigmático é o de Domingos da Calçada, um veterano combatente da região do Vale do Neiva, já com vasta obra publicada, que tem escrito sobre os usos e costumes do seu rincão natal, bem como de algumas figuras populares que marcaram uma época.
Com o título “Seroeira”, editados pela Casa do Povo de Durrães, terra da naturalidade de Domingos de Castro Barbosa Maciel, onde nasceu em 18 de Fevereiro de 1931, publicou três volumes de contos, intitulados “Rumores d’Águas Passadas”, “Tempos Difíceis” e “Em busca da Pataqueira”.
Esta colecção, publicada entre 2001 e 2007, segundo afirma o autor, exibe um “tríptico” do Vale do Neiva que retrata pessoas com “os seus defeitos e virtudes”, “personagens há muito desaparecidas” (primeiro volume), pessoas marcadas “pelos anos que martirizaram muitos dos habitantes simples e humildes”, “pessoas a derramar lágrimas de fogo e sal sobre rostos encardidos, mirrados pelo sofrimento” (segundo volume), emigrantes que “demandaram outras terras, tentando a melhoria de vida” (terceiro volume, dedicado ao falecido seu irmão Carlos Augusto).
Teve o autor a áurea de ver parte destes sessenta e seis contos de temática rural dos finais do século XIX e primeira metade do século XX, publicados, em 2013, em novo volume, pela editora bracarense “Calígrafo”, do barcelense Fernando Pinheiro, intitulado “Gente do Vale”, que faz desfilar, diante de nós, uma série de personagens: lavradores, frades, mercadores, artesãos, feirantes, pedreiros, ferroviários, jornaleiras, padres, romeiros e brasileiros de torna viagem.
Segundo o editor, “a riqueza de informação contida nestes contos faz com que a “Seroeira” seja muito mais do que uma simples obra literária, porquanto são notáveis os contributos que ela dá para o conhecimento folclórico, etnográfico, sociológico e antropológico de um povo que sempre cultivou ao longo de milénios um modus vivendi particularmente peculiar.”
Dois anos mais tarde, e com a mesma chancela, Domingos da Calçada publica “Muitos Pecados - Poucas Virtudes”, com novas crónicas e novos contos, descrevendo as virtudes e defeitos daquele povo, mas também a sua luta pela sobrevivência, denunciando ainda os abusos cometidos. Em 2016, sai “O Rasto da Memória”, trazendo mais uma vez ao de cima, a experiência humana da gente do Vale do Neiva, em tempos marcados pela miséria, analfabetismo e abuso dos poderosos.
Mas, Domingos da Calçada que, na Cidade Invicta, foi aprendiz de caixeiro, no célebre “Passeio dos Carapuceiros”, situado então no lado esquerdo da Rua dos Clérigos, não quer ficar por aqui. E, no prelo, está já um novo livro, também de contos e de crónicas, intitulado “A Voz das Sombras” que vai ser publicado, em breve, de novo, pela Calígrafo.
Este conceituado autor barcelense publicou ainda dois livros de poesia: “Outonias”, edição de autor, em 1988 e “Poemas Tardios”, editado pela Tertúlia Barcelense, em 2014.
Domingos da Calçada é um cavaqueador nato. Por isso, os seus encontros com os alunos, quer na Biblioteca Municipal, quer nas escolas, são sinónimo de casa cheia e sessão conseguida.
É este trabalho aliciante de divulgação dos autores locais junto dos estabelecimentos de ensino, um trabalho silencioso, mas profícuo, que a Biblioteca Municipal realiza, periodicamente, lançando os alicerces de uma verdadeira formação integral do indivíduo e do culto da cidadania.
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