Correio do Minho

Braga, quinta-feira

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A Família Casimiro

Os bobos

Conta o Leitor

2018-07-31 às 06h00

Escritor Escritor

Autor: Maria Adelaide

Julieta está tão cansada, que se sente incapaz de poder continuar a carregar o fardo que sua família lhe tem imposto.
Casimiro repara na esposa e fica preocupado. – Que se passa? Pergunta carinhosamente?
– Não sei! Sinto um vazio!
– Hum...um vazio! Por vezes também me sinto assim!
Do alpendre chega a traquinice da filha mais nova. Andava de bicicleta. No quarto ao lado, o filho mais velho estava distraído, distante, era como se não estivesse ali. Na verdade, estava como sempre perdido no telemovel. É sempre assim...ultimamente, não o vejo fazer mais nada... Não sei o que fazer com este miúdo! Só a filha do meio estava serena, com ar de felicidade, deitada em cima da cama lendo um livro. Deixou-se ficar a observar o seu comportamento. Mexia o corpo de um lado para o outro, sorria e voltava a sorrir.
Julieta suspira profundamente, e quase sem dar por isso, está com o telemóvel ligado. Olha para o lado, o marido fazia o mesmo. Que se passa connosco? Pensa de relance. Já não conversamos, estamos sempre aqui quase dentro do telemóvel à procura sem sabermos de quê. É sempre assim...cada um para seu canto. Parecemos estranhos que vivem juntos! Quando casámos nada disto era assim! Tenho saudade desse tempo. E num ápice perde-se no Facebook.
O mal-estar aumentava, aquele aperto no peito, a ausência de tudo! Por mais que procurasse não encontrava nada que aliviasse aquela dor, que a atormentava cada vez mais, aquele aperto não desaparecia. Aquela insatisfação, quase doí-a.
– A minha vida é uma desilusão. Diz enquanto desliga o telemóvel.– Disseste alguma coisa? Pergunta o marido. – São horas de preparar o jantar, vens ajudar-me?
– Estás maluca mulher! Não vês que estou ocupado!...
– Nem por ser Sábado! É sempre assim! Os corpos estão aqui: – hum...apenas isso, os corpos....as almas sabe-se lá onde andam! Nem parecemos uma família...
– Mãe! Mãe! Tens que ler este livro! Vais gostar. Ouvem-se os gritos da filha que de um salto corre para junto deles.
– Tens de ler este livro! Repetia vezes sem conta.
Casimiro é o primeiro a dar-lhe atenção. – Então mostra lá! O que queres impingir à tua mãe?
– Não é impingir pai! Acho que deviam ler, em vez de estarem sempre na Internet, aí não aprendem nada.
– O que diz o livro filha? Julieta precisava que a ajudassem a sair daquele impasse, em que se encontrava, ela e a família.
– Diz aqui que os dias são para sempre! – Para sempre!?
– Sim mãe! Para sempre! – Que disparate! Isto não pode durar para sempre! – Ficaste assustada?
– Nada me podia assustar mais que ver a minha família assim dispersa para sempre.
Os olhos do pai e da mãe fixaram-se nos seus. Ela saltitava de um lado para o outro com uma alegria contagiante. Do quarto o irmão mais velho houvesse uma exclamação:
– Já estou mal que chegue, barafusta, mas ainda ter que levar com essa tua inesperada alegria!... – É de mais!
– Mano, tens de ler este livro. – Cala essa boca! Estou farto de te ouvir...
Prosseguiu observando a sua expressão – desculpa dizer-te isto – estás mesmo muito mal.
– Já ordenei que te calasses!
– O livro é lindo! Devias lê-lo! Insistia.
O rapaz desliga o telemóvel e diz: – bem já que não te calas, vamos lá ver isso!
Do seu canto o pai fica curioso. – Então do que trata o livro? – Diz que os dias são para sempre! São eternos!
– Para sempre! Eternos? Hum...estou a ver! Já custa aguentar um de cada vez!
– Acreditem! É lindo, deviam ler! Insistia a jovem.
Mediante tamanha insistência, o rapaz segura o livro, vira as paginas ao acaso, lê apenas o início de cada capítulo, encolhe os ombros, e murmura: – parece interessante.
Ouvindo tal comentário, é a vez de o pai satisfazer a sua curiosidade, e repete o mesmo gesto.
– Hum...hum...parece-me bem!
Quatro olhares se fixaram. Sorriram de contentamento, e repentinamente estavam abraçados. Há muito que isto não acontecia! Num ápice a porta abre-se, a filha mais nova choramingava, tinha caído e ficara apenas com uns pequenos arranhões nos joelhos. Ao vê-los com o livro na mão, limpa as lágrimas e resmunga: – esse livro é meu! Não mexas nas minhas coisas!
Desculpa, mana: – o livro é tão lindo! – Aquela estante tem muitos livros de adultos! Este é meu!
– Como sabes que aquela estante tem livros de adultos?
– Às vezes também leio livros de adultos! – Ai a menina! Repreende-a a irmã. – Pois.... bem digo eu , esta casa está virada do avesso! Pensava Julieta.
Mãos se cruzavam, olhares como que se acariciavam – toda a família procurava um livro numa estante que existia mas de que nem se tinham dado conta. Cada um procurava o que mais lhe interessava. A escolha era difícil. No entanto ninguém desistia. Talvez a alegria da filha mais velha os contagiasse, e até saltasse de dentro de um livro e salvasse aquela família. A dada altura a filha mais nova perguntou:
– Afinal de quem são estes livros?
Os pais sentiram-se paralisados. E olhando um para o outro como para se desculparem:
– Pertenciam ao meu pai. Ao teu Avô. Responde a Mãe. – A minha professora diz que devíamos ler todos os dias.
– Isso mesmo, todos os dias! Suspira Julieta.
Ninguém parecia interessado na sua resposta. Naquele momento, apenas queriam encontrar um livro que lhes provasse que ler não era apenas uma mera perder tempo.
Aos poucos foram-se acomodando. Todos tinham na mão um livro. De vez em quando suspiravam profundamente, levantavam o olhar e sorriam. Continuavam, e assim passaram um bom bocado. Naquela noite, ninguém mais se lembrou do telemóvel.
– A felicidade está dentro de nós, só temos de a descobrir! Grita Julieta do seu canto.
– Também gosto do que estou a ler. Responde o marido. (Nunca deixes de viver o teu sonho.) Será! Será que ainda estou a tempo de criar o meu negócio?
Julieta pousa o livro e abraça o marido. – Querido, só podes saber se tentares! Aconselho-te a pensar seriamente no assunto.
– Estou a sentir-me motivado – retorquiu num fio de voz.
A seu canto o filho mais velho lia. Porém, o seu semblante era sisudo, tudo levava a crer que não gostava do que estava a ler. A dada altura levanta- se, e, em pé, para que todos ouvissem lê uma simples frase cujas palavras, mudariam para sempre o rumo daquela família:
– «As pessoas sábias procuram soluções. Os ignorantes nunca se libertam do insucesso».
Admirados, olharam uns para os outros. Cada um à sua maneira vivia aquele momento, alguma coisa mudava dentro de cada um. Tudo levava a quer que pensavam. – “A alegria não está nas coisas, esta em nós.”
Durante o jantar a conversa tornou-se interessante à volta da mesa. Naquela noite, falava-se de livros. Depois de arrumarem a cozinha em conjunto, cada qual tinha o seu livro na mão.
Toda a família é interrompida pela filha mais nova. Chega junto de cada um e diz: – Já li esse livro. Já li esse livro e brincava e saltitava em volta dos adultos, muito feliz.
De repente a felicidade estava ali. Os irmãos conversavam, os pais brincavam com a filha mais nova.
– Filha ainda bem que já sabes ler. Benditos os professores que nos ensinam. Que este instante seja de felicidade para todos nós! Que todos os dias sejam de aprendizagem com uma boa leitura e um bom livro. Que neste natal todos ofereçam livros.
– Benditos os autores e escritores. Que Deus os ajude a transmitir-nos pela palavra escrita, os ensinamentos para a Vida.

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