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A falar é que a gente se entende

Assim vai a política em Portugal

Ideias

2014-12-19 às 06h00

Borges de Pinho Borges de Pinho

Ou talvez não!... “Marinho e Pinto tem daquelas coisas que, num país de cágados, me faz gostar dele: dá bocas. Marinho e Pinto tem daquelas coisas que, em quem dá bocas, me põe de pé atrás em relação a ele: é desbocado” (Ferreira Fernandes, Diário de Notícias, 6.10.14). E se estas palavras nos merecem atenção, curiosidade e até aprovação, não podemos deixar de referir que “criou um novo partido, o PRD ( onde) o desbocado vai voltar a ter uma tribuna onde trabalhar”, impondo-se de todo sublinhar ter dito “«vou fazer o striptease que outros se recusam a fazer. (e) Não tenho nada a esconder em relação ao chorudo salário (de eurodeputado) que me pagam»”. E continuando a seguir Ferreira Fernandes, aplaudimo-lo com entusiasmo quando escreve que “o que se lhe pede não é striptease, é despir-se desse ordenado”, já que “continua a ganhar um ordenado por fazer de conta num lugar inactivo” (id.).
É de todo óbvio que a «figura» de Marinho e Pinto é inimitável e inconfundível, e se nunca nos atrevemos a apodá-lo de desbocado a grande verdade é que desde há muito vimos escrevendo e dizendo que em miúdo lhe «cortaram demais a trave», como aliás o povo, na sua sabedoria de ruralidade e vida, costuma dizer das pessoas que falam demais, desbocadas e que gostam de falar e de se ouvir. E sobretudo, admita-se e reconheça-se, de serem conhecidas, faladas e de ter sempre audiência. Aliás o Marinho e Pinto, que agora já nem é bastonário e tem já quem o imite bem num ruidoso falaciar, quer continuar a ter ouvintes, e mesmo um «palco político», o que nos pasma de todo pois sempre pensámos que não lhe agradasse a política ... nem o «dinheirinho», as benesses e a projecção social e pública daí resultantes. Simplesmente, o que é uma incontornável realidade, a política e seus «negócios» se de início se estranham logo se entranham e marcam as pesssoas, até lhes mudam e moldam a figura.
Aliás todo aquele naipe de frases e expressões de sua autoria encaixadas em duas páginas do JN de 5.10.14 formatando uma entrevista que tem por título «Costa começou a pagar, veremos como é com o aparelho do Estado», de imediato deixam entrever um Marinho e Pinto fogoso, intencional, contundente, agressivo, palavroso, populista recorrente e sem papas na língua que «lança» o PRD e pretende arvorar-se como um intrépido defensor da pátria, da cidadania, da seriedade, da honestidade e da verdade. Dando a conhecer a sua opinião sobre Seguro (“dava mais garantias de honestidade política”) e Costa (“uma grande desilusão”), nessa entrevista diz expressamente que o “Guterres pirou-se e terá muita coisa para explicar”, referindo ainda ter “receio da capacidade de António Costa de gerir o imenso exército de clientes” ( porquanto) “criou à sua volta uma tal rede clientelar que dificilmente se livrará dela” (e) “apareceu rodeado de figuras que não deixaram saudades. Mário Soares foi muito importante mas hoje ... enfim, é preocupante. As ligações, aquilo que a sua fundação quer do Estado...Também é preocupante vermos pessoas como Jorge Coelho voltar à política após serem ministros, beneficiarem empresas privadas, irem para a administração dessas empresas e agora voltarem como se fosssem virgens. É com Almeida Santos, Manuel Alegre, Mário Soares e Jorge Coelho que António Costa quer renovar a governação e o PS ? (...) Vamos voltar ao tempo em que quem manda no Governo são duas ou três empresas como a Mota-Engil e a Fundação Mário Soares”. Jogando com o cenário hipotético mas possível do Costa a primeiro ministro e de Guterres como PR opina que isso seria criar as condições para “o aparecimento do pântano (havido) na segunda metade da década de 90” do qual, diz ele, Guterres se escapuliu, pois “pirou-se do país, fugiu daqui, fugiu do pântano e, se calhar, de algumas pessoas muito próximas dele”, informando que Costa e Jorge Coelho eram na altura seus ministros e concluindo que “as mesmas causas nas mesmas circunstâncias produzem sempre os mesmos efeitos”
Um palavreado de ocasião, oportuno e de «lançamento» que apesar de tudo e no entanto merece toda uma atenção já que diz estar disposto a fazer “entendimentos com o diabo se isso for útil para o povo português” (corajoso!...) mas “exclui o CDS porque deu sinais de pôr os interesses pesssoais, dos dirigentes e clientela, acima dos nacionais” (id).
Mas se é a falar que a gente se entende, importará anotar que “Cavaco culpa partidos e teme implosão do sistema” (título do JN de 6.10.14), como aliás flui das palavras que proferiu no discurso de 5 de Outubro onde fez referência à “tendência para a demagogia e o populismo” e disse expressamente que “o incumprimento das promessas feitas constitui um dos principais factores de aumento da descrença dos portugueses na sua classe política e de desconfiança nas instituições”, tendo feito um apelo aos políticos para que assumam “de uma vez por todas uma cultura de responsabilidade e uma cultura de verdade”.
Umas palavras doutas e incontornavelmente relevantes vindas de um profissional da política que foi primeiro ministro durante dez anos e é PR também há quase outros dez, pelo que se nos impõe meditar e recordar. Aliás são palavras que, não podendo deixar de envolver em si mesmas uma auto-crítica, experiência e o reconhecimento de certo descalabro na política, de algum modo reclamam toda uma cuidadosa atenção e análise. E de todos, diga-se, mesmo dos que desde há muito, como nós, pertencem ao «clube» dos insatisfeitos, desconfiados e descrentes no que concerne à honestidade, seriedade, verdade, rentabilidade, utilidade e competência da classe política, já que são todos iguais e tão só «competentes» no que tange a amiguismo, clientelismo, arrangismos e a tudo o que vá desaguar em mais dinheiro, mais regalias pessoais, mais projecção social e mais nomeada pública.
Aliás, e apenas para se dar exemplo de todo um companheirismo e amiguismo, anota-se que, embora “as empresas municipais estejam falidas (...) continuam a fazer ajustes diretos para consultores de comunicação” (C.Manhã, 7.10.14), dizendo-se e escrevendo-se que na câmara de Gaia, hoje do socialista Vitor Rodrigues, a empresa da mulher de Guilherme Pinto, o socialista agora dito independente da câmara de Matosinhos, “ganhou em seis meses quatro contratos de assessoria de comunicação e imagem. Dois com a câmara: um com a Águas de Gaia e o último com a Gaiurb. O valor global é de 113361 euros”. Simplesmente, como diz o autarca gaiense “«ninguém perde direitos pelo facto de, sorte ou azar, ser casado com alguém público»”.
Mas a realidade dos factos mostra-nos que se efectivamente lá perder não perde a verdade é que consequentemente, ou por mera coincidência, lá que ganha ganha!... E porque a falar é que a gente se entende não há como escamotear e esconder todo um vingar de influências, ingerências, amizades, companheirismo e clientelismo político-partidário desde a revolução de Abril, sendo real e profunda toda a descrença de um povo e não descartável um cenário de implosão do sistema.

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