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A Ecologia, a Enfermagem e a Magia do Harry Potter

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A Ecologia, a Enfermagem e a Magia do Harry Potter

Ideias

2020-06-30 às 06h00

Analisa Candeias Analisa Candeias

As redes sociais têm coisas maravilhosas. Também têm coisas menos boas, mas, em geral, se bem utilizadas, as redes sociais podem ser fonte de grande aprendizagem. Há cerca de ano e meio comecei a seguir no Instagram uma colega enfermeira (irmã de uma pessoa que conhecia já há alguns anos) e que tornou o seu perfil público, no sentido de dar a conhecer as suas opções de vida mais ecológicas e mais humanas. Ter conhecido as suas escolhas produziu uma transformação gigante na minha vida: a partir desse momento comecei, também eu, a optar por uma vida mais sustentável, assente, principalmente, numa vivência livre do uso de plástico.

Os primeiros meses foram de procura e habituação, com grande ênfase na reciclagem. Procurar aquilo que é de uso diário e que não «podia» ter plástico na sua constituição ou, se tivesse, tinha de ser reutilizável: escova de dentes, pasta dos dentes, champô, gel de banho, … … … Encontrei tudo isto. E habituei-me. Alguns exemplos: as minhas escovas de dentes passaram a ser as de bambu, a minha pasta dentífrica passou a vir num boião (que depois podia usar para guardar as compotas, as sobras ou o que quisesse), o meu champô passou a ter a forma de um sabonete e o sabonete passou a fazer parte, novamente, da minha vida. Esta foi a primeira fase. Estou mais do que habituada a estes novos produtos de higiene em formato algo peculiar para os dias que correm. A segunda fase foi a da cozinha e dos alimentos: comprar a granel, valorizar o mercado local e utilizar sacos de pano para a compra da fruta e legumes (em vez daqueles de plástico transparentes que são um horror). E fazer pão em casa, iogurtes e bolachas. Encontro-me agora na fase de adotar uma forma de vestir e calçar também mais sustentável – até ao momento, tem sido a etapa menos fácil. Tudo é estabelecido com tempo, peso e medida. Com hábito.

Esta transformação não foi/é simples. Primeiro, e talvez antes de alguém começar, sugiro que haja uma reflexão sobre a importância destes novos hábitos nas rotinas diárias. Não podem ser feitos apenas porque a ecologia está na moda, mas sim porque existe o desejo de compromisso com o Outro – que pode ser o planeta, obviamente. Talvez a minha formação em enfermagem tenha ajudado ao exercício dessas escolhas na minha vida, visto que a minha profissão me ensinou a olhar o bem desse Outro que precisa de ajuda. Ensinou-me sobre a vulnerabilidade, sobre a compaixão, sobre a paciência. E ainda sobre passos seguros, que podem ser dados de forma lenta, mas que trazem frutos a longo termo. Neste aspeto, admiro as diferentes Greta Thunberg deste mundo que, passo a passo, marcam ritmos importantes.

As mudanças não se cingiram apenas às que referi anteriormente. Vão muito mais além, implicaram alterações do estilo de vida, numa flexibilidade que a enfermagem também me tem vindo a ensinar e ajudar a praticar. Não são fáceis de manter, exigem disciplina. Tento viver de uma forma ecológica perfeitamente imperfeita, respeitando os meus espaços e ritmos. Sou, igualmente, uma enfermeira imperfeita, que todos os dias aprende coisas novas que podem ser úteis para melhorar o mundo que me rodeia – ou, pelo menos, tenho feito a tentativa de. Penso que por vezes era bem mais fácil ter uma varinha de condão e colocar tudo ao jeito que poderá ser melhor, tal qual como nos filmes do Harry Potter. Todavia, nem o Harry Potter conseguiu colocar tudo perfeito de uma vez e nem no final a coisa correu de forma linear. Foi perfeitamente imperfeito. Existem sempre curvas, seja na ecologia, na enfermagem ou em Hogwarts.

A enfermagem também me ensinou que o pouco que damos pode ter um enorme impacto a médio e longo prazo. Assim funciona o mundo ecológico, em que, se cada um de nós fizer o pouco que lhe cabe, contribuiu para uma transformação massiva e global. É bom que existam dez pessoas a serem ecologicamente perfeitas, mas será muito melhor que um milhão de pessoas sejam ecológicas de forma perfeitamente imperfeita. E, tal como o Harry Potter tinha a sua Hermione e o seu Ron, também nós, os que enveredamos por estes caminhos, podemos encontrar ecos de apoio na comunidade – tal como eu encontro nas equipas de enfermagem a que vou pertencendo e que me ajudam a modelar a postura perante a profissão.

Estas foram escolhas muito pessoais e que se encontram, diariamente, a serem confirmadas. A partilha deste percurso poderá ajudar outros a refletirem sobre os hábitos e estilos de vida e, quem sabe, a optarem por uma vivência do dia-a-dia mais ponderada, mais lenta e mais integrada no planeta que nos acolhe. Ou não. As escolhas poderão ser diferentes, e também estão bem, se não forem prejudiciais ao Outro. Na verdade, o Harry Potter também optou por caminhos distintos para salvar o mundo e, no fim, tudo correu bem.

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