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A ascensão do ódio

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A ascensão do ódio

Ideias Políticas

2024-10-29 às 06h00

Inês Rodrigues Inês Rodrigues

A política em Portugal enfrenta uma crise de valores e de ética no discurso público. Nos últimos anos, assistimos à ascensão de forças políticas que, sob o disfarce de apelos à segurança e à ordem, perpetuam uma narrativa de divisão e ódio que ameaça os alicerces da nossa democracia. As recentes declarações de André Ventura e Pedro Pinto, após a morte de Odair Moniz, provocaram uma onda de consternação na sociedade portuguesa. Este episódio não é apenas mais uma exibição de populismo ou um apelo simplista à “lei e ordem”, mas sim uma séria ameaça ao Estado de Direito e aos valores fundamentais que sustentam a nossa democracia.
Ventura, num desrespeito flagrante pelas garantias legais e pela dignidade humana, aplaudiu o polícia responsável pelo tiro que ceifou a vida de Odair Moniz. Nas suas redes sociais, chegou a referir-se a Odair Moniz como um “bandido” e sugeriu que os polícias deveriam ser condecorados, isto sem se saber o que realmente tinha acontecido na noite da morte. Já Pedro Pinto, em debate na RTP3, acrescentou que, “se disparassem mais a matar, o país estaria mais na ordem”. Estas palavras demonstram um incentivo à violência que choca e divide a sociedade, criando um cenário de impunidade e legitimando uma perigosa prática de justiça pelas próprias mãos.
Estas declarações ultrapassam a barreira da opinião pessoal e tornam-se um verdadeiro incentivo à prática de crimes. Ao sugerirem que a execução sumária é um meio de “trazer ordem”, estão a promover uma sociedade onde o direito à vida é desvalorizado e onde certos cidadãos são rotulados como menos dignos de proteção com base na cor da pele ou na sua etnia. O impacto destas ideias é profundo e atinge especialmente as comunidades marginalizadas, como a da Cova da Moura, que já enfrentam desafios diários de exclusão e preconceito.
Mas não é apenas uma questão de discurso irresponsável: é um convite explícito ao desprezo pelo Estado de Direito, que estabelece que todos, sem exceção, têm direito a um julgamento justo. Sugerir que as forças policiais deveriam agir fora das normas legais é abrir caminho a uma sociedade que tolera abusos de poder e injustiças. Estes ataques aos princípios de justiça minam diretamente a confiança da população nas instituições, polarizam a sociedade e fomentam um ambiente de desconfiança e medo, onde o racismo e a discriminação encontram terreno fértil.
Em vez de propor políticas de inclusão social, de acesso à educação e ao emprego, que reduzam a criminalidade e criem oportunidades, opta-se por estigmatizar comunidades já vulneráveis. Este é um caminho perigoso. Nos bairros como a Cova da Moura, onde a falta de oportunidades muitas vezes empurra os jovens para situações de risco, o investimento em programas de apoio e integração é a verdadeira solução para a paz e para a segurança duradoura.
Enquanto agentes políticos, é um dever levantar a voz contra esta normalização do discurso de ódio e da apologia da violência. O caso de Odair Moniz deve representar um alerta para a urgência de promover uma cultura de paz, que valorize a vida e que trabalhe para transformar, e não para estigmatizar as comunidades em risco.
A verdadeira força de uma sociedade não reside na capacidade de usar a força para impor a ordem, mas sim na capacidade de promover justiça e igualdade para todos. Estamos aqui para lutar pela construção de um país onde todos possam viver sem medo, sem ódio e com o respeito que merecem.

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