Correio do Minho

Braga, terça-feira

- +

A armadilha da meritocracia

1.758.035 votos de confiança

A armadilha da meritocracia

Ideias

2021-12-03 às 06h00

J.A. Oliveira Rocha J.A. Oliveira Rocha

No jornal “O Público” da semana passada, Daniel Markovits deu uma importante entrevista sobre a meritocracia como bloqueador da igualdade e da democracia.
Nela, o autor, professor de Harvard, desenvolveu a ideia de que a meritocracia criou uma elite, uma nova oligarquia baseada no investimento na educação. Os novos-ricos monopolizam os empregos com os melhores salários e trabalham mais horas. Estes resultam de um investimento na educação e moldam a sociedade e a educação à sua maneira, impondo os seus valores.
Esta nova classe torna a classe média uma sombra, a qual se aproxima cada vez mais das classes baixas.
Houve tempos em que para a elite, o trabalho era malvisto; viviam das heranças, dos lucros das fábricas e das propriedades e o resto da sociedade trabalhava para eles. Hoje, se se é elite valoriza-se o trabalho, diz-se que se está sempre ocupado, acreditando que se merece integrar a elite.
E, o autor termina, dizendo que é necessário promover uma classe média que não aspire à riqueza extrema. De outro modo, esta sociedade, ou termina numa guerra, ou numa revolução.
Embora em diferente contexto, o problema da meritocracia vs. democracia é antigo, remontando a meados do século passado.
Desde os finais do século XIX que se acreditava que o fim da “patronage” só podia ser conseguido com o recrutamento com base no mérito, encontrado através de testes, ou concursos. Passado pouco tempo, verificou-se que a alta administração pública americana era ocupada por brancos, oriundos de classes altas.
Este problema agravou-se com o “New Deal”, porquanto os quadros superiores eram pouco abertos às novas orientações políticas. Recorreu-se, então ao conceito de burocracia representativa. A ideia fundamental era de que mais importante que o recrutamento com base no mérito, importava que a democracia representasse todos os segmentos sociais, formas de pensar e grupos étnicos. Na verdade, constatava-se que a burocracia tradicional representava uma determinada classe e era de harmonia com esses valores que as novas orientações eram interpretadas e as políticas implementadas. Surge então nos Estados Unidos a “representative action”, ou a discriminação positiva, segunda a qual se pretende que nas organizações públicas haja uma representação proporcional entre os funcionários e a população que representam.
Também em Portugal se observam fenómenos indiciam uma rutura da democracia vs. meritocracia. Assim, e por exemplo, os filhos das classes altas frequentam cada vez mais universidades europeias e americanas de topo. Por outro lado, a classe média está em vias de desaparecimento. E um indicador é o de que os salários médios estão cada vez mais próximos do salário mínimo. Em resumo, tudo cá chega às vezes com formas menos claras, coado pela cultura nacional.

Deixa o teu comentário

Últimas Ideias

19 Março 2024

O fim do bi-ideologismo

Usamos cookies para melhorar a experiência de navegação no nosso website. Ao continuar está a aceitar a política de cookies.

Registe-se ou faça login Seta perfil

Com a sessão iniciada poderá fazer download do jornal e poderá escolher a frequência com que recebe a nossa newsletter.




A 1ª página é sua personalize-a Seta menu

Escolha as categorias que farão parte da sua página inicial.

Continuará a ver as manchetes com maior destaque.

Bem-vindo ao Correio do Minho
Permita anúncios no nosso website

Parece que está a utilizar um bloqueador de anúncios.
Utilizamos a publicidade para ajudar a financiar o nosso website.

Permitir anúncios na Antena Minho