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Braga, terça-feira

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À procura do sonho

A responsabilidade de todos

Conta o Leitor

2019-07-21 às 06h00

Escritor Escritor

Maria Clarinda Alves

O sol da manhã que abria os olhos, esticava os braços, matizando o céu com um maravilhoso azul, levemente pincelado de algodão, e bebia o orvalho da manhã, contrastava com a atmosfera sombria e cinzenta que, descarregando os seus irados raios, envolvia Dora Bela.
Na sua minúscula sala, Dora Bela, olhando sem nada ver, pensava, pensava no rumo que daria à sua vida. E por mais cantos que percorresse, não encontrava a saída.
Dora Bela tinha ficado sem emprego. A fábrica onde trabalhava, de um momento para o outro e sem saber porquê, fechara. O pouco que amealhara já começava a escassear. Com as solas moídas, de tanto andar atrás do trabalho, ressoava nos seus ouvidos a frase: “Logo que nos seja possível, contactá-la-emos.”
Que fazer? Eram as lágrimas e os soluços abafados o remédio para a sua insegurança, o bálsamo para as astuciosas ideias que, de vez em quando, a convidavam para pôr um fim a tudo.
Todas as manhãs, bem cedo, da sua janela, via um menino que, pela mão da sua mãe, passava para o colégio, carregando consigo uma mochila cujas rodas deixavam um som agradável no passeio.
Como gostaria de convidar a alegria e inocência que todos os dias passavam, à sua porta, na mochila daquele menino. Como gostaria de se transformar num sonho e partir também, naquela mochila, a caminho da esperança.
A vida de Dora Bela foi sempre colorida de sombrias cores. Abandonada à nascença e criada num orfanato, não tinha, na sua memória, o calor de um abraço, a sensação de um carinho, de ser guiada pela mão da sua mãe. Do passado, sabia apenas a origem do seu nome: Dora, porque a freira que a encontrara à porta do orfanato, assim se chamava; Bela, porque estava uma linda manhã.
Por isso, agastava-se sempre que ouvia os que, tendo emprego, resmungavam contra ele, desejando apenas as férias; indignava-se com os que, tendo o preciso para o dia-a-dia, viviam descontentes; revoltava-se com os que, tendo mais do que o necessário, estavam constantemente insatisfeitos. Estas pessoas, na ânsia de querem mais, não saboreavam o presente; ela que nada tinha, gostaria de saber que sentimento resultaria, se essa a ingrata sociedade passasse um dia pela sua vida.
Depois de ter andado toda a manhã à procura de trabalho, depois de comer uma sanduíche ao almoço, Dora Bela, com os pés doridos, sentou-se. Mas mal a tarde começou, saiu.
Nem o sol que abraçava, nem a carícia da brisa, conseguiam animá-la. Ao passar pela praça, sentou-se num banco sob uma frondosa tília. As pessoas passavam, falavam, riam. Dora Bela não conseguiu evitar as lágrimas. E enquanto tentava limpar as lágrimas com os dedos, uma sombra tapava-lhe o sol.
- Uma rapariga tão bonita a chorar! Só pode ser de alegria.
- Sim. Uma rapariga bonita não pode chorar. - repetiu o jovem.
Dora Bela ergueu a cabeça. A transparência, a serenidade estavam naquele rapaz que, não sendo bonito, era suave. No entanto continuou calada.
- Agora, a sério. Algo me diz que não estás feliz. Não és a única. Se adivinhasses as dificuldades da minha vida. Hoje, já me recusaram três pedidos de emprego. Estou desiludido, mas não perdi a esperança - disse o rapaz.
- Estou a ver-me ao espelho. Só que o meu não tem esperança. - foram as palavras de Dora Bela.
- Chamo-me Dinis e parece-me que a nossa viagem tem o mesmo destino. Tenho aqui o endereço de um local onde estão a contratar pessoas. Queres vir? Pode ser que tenhamos sorte.
- Chamo-me Dora Bela.
- Dora Bela? Eu não te disse que eras bonita?
Pela praça, Dora Bela e Dinis partiam na busca de um sonho. Ele continuava com a esperança. Ela começava a sentir o abraço do sol, a carícia da brisa. Aquele rapaz de discurso alegre, esperançado no amanhã, reparara nela. Os contratempos, agora, doeriam menos, enfrentá-los-ia com o Dinis. Ele via-a.
E como alguém dizia: “Uma alegria compartilhada transforma-se numa dupla alegria; uma tristeza compartilhada transforma-se numa meia tristeza”.

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